O boletim Focus divulgado agora há pouco trouxe uma leve revisão na inflação esperada para esse ano. De 3,33% para 3,46%. O motivo é uma pressão no grupo de alimentos vindo das carnes. Houve também uma revisão no crescimento esperado, de 0,92% para 0,99%. Outro destaque do boletim é uma revisão no câmbio esperado, que agora está em 4,10 R$/US$. A evolução do câmbio, diga-se, pode ser um fator a pressionar uma revisão do cenário de juros traçado pelo Banco Central.
Como se sabe, há um repasse entre desvalorização cambial para a inflação, que pode ser capturado por uma Curva de Phillips como abaixo:
(1)
com a imposição da restrição de verticalidade de longo prazo:
(2)
Basicamente, a inflação dos preços livres é uma função linear da **inflação passada**, das **expectativas de inflação**, do **hiato do produto** e da **inflação importada**. Como estimamos na edição 48 do Clube do Código e como ensino nos cursos de Macroeconometria usando o R e Modelos do Banco Central, uma elevação de 10% na inflação importada provoca, em média, uma elevação de 0,56 p.p. nos preços no horizonte de um trimestre.
Esse repasse, contudo, não é automático posto que depende principalmente do grau de ociosidade da economia. Sabe-se que com o hiato do produto em terreno negativo, há maiores dificuldades para um repasse integral desse aumento para os preços. É justamente por isso que não se pode decretar que a escalada do câmbio nas últimas semanas irá afetar a queda dos juros na reunião de dezembro do COPOM. É preciso acompanhar/estimar o efeito dessa escalada sobre os preços na próximas semanas, de modo a verificar se está tendo alguma contaminação. Notadamente sobre os preços considerados tradeables, aqueles mais sensíveis a movimentos do exterior.
O boletim Focus divulgado hoje pela manhã trouxe uma boa notícia. Após 20 semanas ladeira abaixo, houve uma leve reversão na expectativa de crescimento para 2019. De 0,81% para 0,82%. A razão para isso é provavelmente a aprovação do texto da reforma da previdência em primeiro turno na Câmara dos Deputados.
A expectativa para a inflação em 2019 caiu de 3,82 para 3,78%, abaixo, portanto, da meta de 4,25%. O câmbio também caiu para 3,75 R$/US$.
Com esse cenário, fica a expectativa de corte na taxa básica de juros na próxima reunião do COPOM, a ocorrer nos dias 30 e 31 desse mês.
No campo dos indicadores, a semana é marcada pela divulgação do IPCA-15 e do CAGED.
O Banco Central divulgou na última quarta-feira a sua decisão sobre a taxa básica de juros. Os membros do Comitê de Política Monetária optaram, nesse momento, por manter a taxa Selic inalterada em 6,5% ao ano. No comunicado, o COPOM subiu um pouco o tom em relação à abertura do hiato do produto e ao cenário benigno da inflação esperada para 2019 e 2020. Por outro lado, também ressaltou que os riscos de não aprovação da reforma da previdência permanecem preponderantes nesse momento.
No comunicado divulgado em maio, no cenário com juros e câmbio extraídos da pesquisa Focus, a inflação esperada para 2019 e 2020 ficava em 4,1% e 3,8%, respectivamente. Agora, a inflação esperada fica em 3,6% e 3,9%, respectivamente. Já no cenário de juros constantes e câmbio a 3,95 R$/US$, a inflação ficava em maio em 4,3% esse ano e em 4% no próximo ano. Agora, com câmbio a 3,80 R$/US$, a inflação fica em 3,6% e 3,7%.
Houve, ademais, uma revisão importante no Focus, com redução na expectativa da taxa básica para o final do ano. Ao invés de 6,5%, espera-se agora 5,75%. O quadro abaixo resume a expectativa dos agentes para as quatro variáveis macroeconômicas mais importantes.
À exceção do câmbio esperado, que pega a média das instituições, as demais variáveis referem-se à mediana. Destaque para a queda monotônica do crescimento esperado para esse ano, que agora está abaixo de 1% - como, aliás, escrevi aqui. A inflação esperada também cedeu na ponta, após o repique verificado em abril. A tabela abaixo, a propósito, resume a inflação observada e os núcleos construídos pela autoridade monetária.
IPCA vs. Núcleos de Inflação (%)
Mensal Mai/19
Mensal Mai/18
Anual Mai/19
Anual Mai/18
IPCA
0,13
0,40
4,66
2,85
Médias Aparadas com Suaviz.
0,29
0,22
4,08
3,20
Médias Aparadas sem Suaviz.
0,22
0,18
3,29
2,42
Exclusão 0
-0,05
-0,01
2,99
2,55
Exclusão 1
0,16
0,25
3,94
2,69
Dupla Ponderação
0,18
0,21
3,76
2,94
Exclusão 2
0,18
0,11
2,96
1,92
Exclusão 3
0,22
0,18
2,88
2,25
A despeito do repique no índice cheio, que permanece acima da meta de 4,25%, os núcleos permanecem bem comportados. O gráfico abaixo ilustra.
A tendência, por suposto, é que os choques recentes sobre o índice cheio se dissipem, de modo que a inflação convirja para valores próximos à meta até o final do ano. É o que indica o comportamento dos núcleos de inflação, que buscam justamente limpar o índice cheio de choques de curto prazo.
Por outro lado, as pesquisas de alta frequência têm indicado que abril também não foi um mês bom, de modo que o segundo trimestre também pode ter um resultado abaixo do esperado. É basicamente o que levou o COPOM a subir o tom em relação ao nível de atividade. O gráfico abaixo ilustra o comportamento da indústria e do comércio ampliado.
A soma de hiato do produto mais negativo do que o esperado a essa altura do ano com inflação subjacente comportada é basicamente o que está levando o mercado a reduzir a expectativa de juros para o final do ano.
O problema é que o Banco Central tem de levar em consideração o que acontece no Congresso em relação à reforma da previdência. Se o relatório conseguir ser aprovado no plenário antes do recesso de julho, o caminho fica de fato aberto para uma redução já na próxima reunião, mantidos, obviamente, o cenário benigno para a inflação, para o ambiente externo e a fraqueza do nível de atividade.
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(*) Como de praxe, os códigos desse comentário estarão disponíveis no repositório do Clube do Código.