Cá entre nós: e daí o que o Keynes realmente disse?

Alexandre Schwartsman publicou no mês passado um brilhante artigo, que considero também uma bela denúncia, sobre a tentativa, ridícula diga-se, de alguns keynesianos de tentar se afastar da administração Dilma Rousseff. Alexandre usou a frase de Einstein a título de comparação: “Se minha Teoria da Relatividade estiver correta, a Alemanha dirá que sou alemão e a França me declarará um cidadão do mundo. Mas, se não estiver, a França dirá que sou alemão e os alemães dirão que sou judeu”. Como não está dando certo, no caso a teoria da president(A), o pessoal keynesiano resolveu que era hora de pular do barco. Eles escreveram um longo artigo, inclusive, publicado no Valor, no qual chamam atenção para o que (DE FATO) Keynes escreveu. Não vou linkar o artigo, posto que o Alexandre já o fez, mas cabe a pergunta: e daí o que o Keynes realmente disse?

Toda vez que eu me ponho a discutir com algum pós-keynesiano - gente boa, inclusive - é a mesma ladainha de sempre: mas o Keynes nunca disse isso! O Keynes nunca disse que era para ter déficit público sempre: ele disse que era para ter superávit em tempos de bonança. Ele disse que era para ter déficit apenas no orçamento de capital: o orçamento de gastos correntes era para se manter equilibrado. Ou seja, leitor, o que o Keynes realmente disse não tem nada que ver com o que esse governo está fazendo, dizem meus amigos pós-keynesianos.

Isso posto, minha questão para eles é sempre a mesma: tudo bem, eu sei o que o Keynes disse, afinal eu fui obrigado a ler a Teoria Geral algumas vezes na minha vida, mas vocês acham mesmo que os políticos o leram? Vocês acham mesmo que os políticos vão sustar os gastos quando o nível de atividade se recuperar? Vocês deveriam ler o  Buchanan e a teoria de escolha pública para entender que a função objetivo de um político não tem nada que ver com isso daí que vocês defendem. As escolhas dos políticos possuem viés inflacionário e estão sujeitas a inconsistência temporal: logo devem haver regras para conduzir a política econômica.

E dito isto, é claro, há a réplica, qual seja os fundamentos que sustentam esses dois conceitos. Dizem meus amigos pós-keynesianos que os fundamentos dos modelos das décadas de 70 e 80 que sustentam as ideias de viés inflacionário e inconsistência temporal são frágeis teoricamente. Eu respondo que eles deveriam então ler a metodologia do Friedman e parar de se concentrar nesse tipo de discussão sobre a irrealidade das hipóteses dos modelos neoclássicos. Mas quem diz que eles me ouvem?

Perpassa, vale dizer, o fato de que o que realmente o Keynes disse não faz muita diferença para efeitos práticos. A despeito das críticas que podem ser feitas aos modelos neoclássicos (muitas, diga-se), o fato simples é que a função objetivo dos políticos ser diferente da função objetivo da sociedade no que diz respeito a bem-estar implica em problemas concretos. Se os políticos querem permanecer no poder, é bastante claro que tentarão burlar certas premissas e conceitos econômicos para atingir esse feito. Não precisa fugir à questão que a origina: basta pensar em termos de racionalidade econômica. E mesmo que você não a admita em pleno vigor, impondo algum tipo de limitação computacional, é difícil contrariar o fato de que os agentes buscarão o melhor para si. E admitindo isso, fica difícil contrariar o fato de que os políticos incorrerão em "um pouquinho mais de inflação" em algum momento.

É essencialmente nesse sentido que o que o Keynes disse ou deixou de dizer sobre o uso da política econômica está fora de moda, para dizer o mínimo. Ainda que muitas mentes tenham relembrado seus ensinamentos na última crise, vai ficando cada vez mais claro - de novo - que uma vez que os governos começam a usar a política econômica para fins anticíclicos eles dificilmente param no momento certo. E aqui os escritos de Friedman parecem fazer sentido. Logo, se Keynes está certo ou não, o problema não é esse: o problema é essencialmente positivo e não normativo. Em outras palavras, as coisas vão desandar se você não tiver regras claras de condução da política econômica.

Alguém aí lembrou do Brasil?

O artigo do Alexandre aqui.

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Como usar automação com Python e IA na análise de ações

No cenário atual, profissionais de finanças buscam formas mais rápidas, eficientes e precisas para analisar dados e tomar decisões. Uma das grandes revoluções para isso é o uso combinado de Python, automação e modelos de linguagem grande (LLMs), como o Google Gemini. O dashboard que criamos é um ótimo exemplo prático dessa integração, reunindo dados, cálculos, visualizações e análise textual em um único ambiente.

Análise de ações com IA - um guia inicial

Neste artigo, você vai aprender a integrar IA na análise de ações de forma automatizada utilizando Python. Ao final, você terá um pipeline completo capaz de coletar dados de mercado, gerar gráficos, elaborar relatórios com linguagem natural.

Quais são as ferramentas de IA?

Um aspecto crucial dos Agentes de IA é a sua capacidade de tomar ações, que acontecem por meio do uso de Ferramentas (Tools). Neste artigo, vamos aprender o que são Tools, como defini-las de forma eficaz e como integrá-las ao seu Agente por meio da System Prompt. Ao fornecer as Tools certas para o seu Agente — e ao descrever claramente como essas Tools funcionam — você pode aumentar drasticamente o que sua IA é capaz de realizar.

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.