A estória por trás do PIB de 2012

Se me pedissem para contar uma estória sobre os motivos pelos quais o PIB brasileiro do ano passado veio tão baixo eu teria que andar alguns passos para trás. Eu dividiria o enredo em antes e depois da crise de 2008/09. No pré-crise, o Brasil era um país que tinha uma política monetária com boa credibilidade perante os agentes internacionais e uma política fiscal guiada por superávits primários e estoque líquido de endividamento em queda. Com base nisso, soube se beneficiar da melhor conjuntura internacional desde o pós-guerra, obtendo assim um crescimento razoável do PIB, inflação efetiva convergindo para o centro da meta e mesmo superávits em conta corrente. Já no pós-crise...

As coisas desandaram, leitor. Os efeitos da crise foram prontamente combatidos pela política econômica anticíclica. Além disso, utilizaram-se os bancos públicos – naquilo que ficou conhecido como instrumentos parafiscais. O resultado mais visível – em termos políticos, claro – foi o crescimento de 7,5% em 2010 e a manutenção da taxa de desemprego em patamares baixos. O governo, entretanto, não parou por ai: quem nunca comeu melado...

A presidente Dilma Rousseff assumiu em janeiro de 2011 e amplificou a inflexão. O Banco Central, guardião do regime de metas de inflação, passou a se subordinar aos desatinos da comandante em chefe. A política fiscal de anticíclica passou a ser pró-cíclica, exibindo correlação positiva com o consumo privado. Ademais, os créditos do Tesouro junto ao BNDES passaram de R$ 26 bilhões em setembro de 2008 para mais de R$ 370 bilhões em dezembro de 2012. A ideia de continuar a incentivar o consumo, entretanto, mostrou-se inócua...

Isto porque, leitor, uma coisa é fazer uma política econômica anticíclica quando há um choque externo. Em números, no quarto trimestre de 2008 – auge da crise – o Consumo das Famílias caiu quase 2% em relação ao trimestre anterior. A indústria caiu quase 8% e a FBCF despencou 10%. Com as políticas anticíclicas implementadas ao longo dos trimestres posteriores, o Consumo das Famílias fechou 2010 com crescimento acumulado de 6,9%, a Indústria de 10% e a FBCF de 21,3%. Com esses dados em punho – e o resultado em termos de redução do desemprego – o governo concluiu erroneamente: é o consumo estúpido! E continuou com os incentivos...

Ao longo de 2011 e 2012, entretanto, as taxas de crescimento acumuladas em quatro trimestres foram declinando quase que monotonicamente para esses três componentes. O consumo das famílias encerrou o último trimestre do ano passado crescendo 3,1% (menos da metade do resultado de 2010), a Indústria caiu 0,8% e a FBCF reduziu-se em 4%. O motivo do declínio do consumo: 43% da renda acumulada em 12 meses pelas famílias estavam, em dezembro de 2012, comprometidas com dívidas e 22% da renda mensal estavam comprometidas com o serviço (juros mais amortizações) dessas dívidas.

O resultado do PIB de 2012, 0,9% frente o ano anterior, é, portanto, apenas o final de um triste enredo. Ele foi causado pela má interpretação da teoria econômica, pela continuação dos incentivos ao consumo em detrimento da atenção aos condicionantes da oferta. O governo (ainda) precisa perceber esse equívoco e tratar de gerar um ambiente de negócios estável para que os investimentos – notadamente em infraestrutura – se materializem, aumentando assim a produtividade da economia brasileira.

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Tratamento e transformação de séries temporais macroeconômicas para modelagem

"Garbage in, garbage out" é a regra de ouro na previsão macroeconômica. Antes de aplicar qualquer modelo de IA ou econometria para prever indicadores como o IPCA ou o PIB, existe um trabalho crucial de tratamento de dados. Neste post, abrimos os bastidores do nosso dashboard de previsões e mostramos o passo a passo para transformar dados brutos de múltiplas fontes (como BCB, IBGE e FRED) em séries prontas para modelagem. Veja como lidamos com diferentes frequências, aplicamos transformações e usamos metadados para criar um pipeline de dados robusto e automatizado.

Como planejar um pipeline de previsão macroeconômica: da coleta ao dashboard

Montar um pipeline de previsão macroeconômica não é apenas uma tarefa técnica — é um exercício de integração entre dados, modelos e automação. Neste post, apresento uma visão geral de como estruturar esse processo de ponta a ponta, da coleta de dados até a construção de um dashboard interativo, que exibe previsões automatizadas de inflação, câmbio, PIB e taxa Selic.

Coletando e integrando dados do BCB, IBGE e IPEA de forma automatizada

Quem trabalha com modelagem e previsão macroeconômica sabe o quanto é demorado reunir dados de diferentes fontes — Banco Central, IBGE, IPEA, FRED, IFI... Cada um com sua API, formato, frequência e estrutura. Esse gargalo de coleta e padronização consome tempo que poderia estar sendo usado na análise, nos modelos ou na comunicação dos resultados.

Foi exatamente por isso que criamos uma rotina de coleta automatizada, que busca, trata e organiza séries temporais econômicas diretamente das APIs oficiais, pronta para ser integrada a pipelines de previsão, dashboards ou agentes de IA econometristas.

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.