
A estória principal que o gráfico conta é que não importa a quantidade de salários: a geração líquida de empregos (empregados menos desempregados) está em tendência de queda. Ocorre que se levarmos em conta os salários, os empregos que pagam melhor já são muito mais escassos do que os que pagam menos. Isso deriva, precisamente, do desequilíbrio que marcou a conjuntura brasileira nos últimos anos: enquanto o setor de serviços se aproveitou dos incentivos de política econômica, a indústria está estagnada. Isso ocorreu porque o setor de serviços é insensível à concorrência externa - afinal, você não vai a Londres cortar seu cabelo, ok? -, coisa bem distinta no caso da indústria. Essa é a trama que se desenvolve se olharmos para a economia em termos desagregados.
O setor de serviços cresceu enormemente nos últimos anos beneficiado pelos incentivos ao consumo. Não é por outro motivo que a inflação de serviços está acima de 8% há mais de quatro anos. A indústria, entretanto, apesar de toda a sorte de subsídios focalizados e dos incentivos de política econômica, sofre com a infraestrutura e o caos burocrático, não resistindo à competição com produtos que vem de fora com custo bem menor.
O setor de serviços, nesse contexto, é quem vem segurando a geração de vagas agregada ainda em terreno positivo, enquanto a indústria demite há algum tempo. Aquele, porém, paga salários menores do que este, o que explica o descompasso visto no gráfico acima: enquanto a geração de empregos de até um salário mínimo e meio ainda está em terreno positivo, acima desse nível as coisas já são negativas. Ambas as séries mostram com bastante transparência que as coisas não vão bem, dada a tendência de queda. Porém, o quadro é bem pior na indústria - que paga salários mais elevados - do que no setor de serviços. Aquela já está em recessão, esse ainda passa pelo purgatório da estagnação.
Esse descompasso na geração de empregos, se considerarmos os salários, se adequa à hipótese do meu amigo. Sergio acha que uma parte do eleitorado não é sensível ao argumento da mudança, que marcou as candidaturas oposicionistas. Para estes, mudar significa arrochar salários, fazer ajuste, reduzir o emprego, acabar com programas sociais, etc. Algo completamente distinto do que eles percebem nesse momento: afinal a geração de empregos de até 1,5 salário mínimo ainda está em terreno positivo. Haveria, assim, uma correlação entre o eleitorado governista e a geração de empregos de até 1,5 salário mínimo.
A despeito da tendência de ambas as séries ser a mesma, a velocidade delas é diferente: os empregos de até 1,5 salário mínimo ainda estão preservados, enquanto acima disso, não. Sendo os eleitores dilmistas parte desse grupo, o discurso da mudança é visto de forma negativa, o que explicaria a aversão à oposição. Mudança aqui é acabar com os empregos!
Se essa hipótese fizer sentido, o candidato da oposição deveria ser mais cuidadoso em sua estratégia de abraçar a "mudança". Particularmente, acho que ele deveria ressaltar a tendência de ambas as séries, enfatizando que o ponto final é o mesmo: recessão. Isso poderia ser feito ilustrando o que está acontecendo com a indústria. Pode ser meio óbvio para economistas ou para pessoas que acompanham economia que as coisas não vão bem: mas para quem trabalha no setor de serviços, será que isso é claro?
Há muitas críticas, eu sei, afinal você pode argumentar comigo: o pessoal odeia o psdb e ponto. Como eu prefiro seguir hipóteses mais criativas, prefiro a do meu amigo! E você, o que acha? Sugestões de como testar isso - base de dados, base de dados! - são muito bem-vindas! 🙂