A economia brasileira passou ao longo dos últimos trimestres por uma situação sui generis: foi possível estagnar a produção sem afetar o emprego. Em outros termos, mesmo com o crescimento decepcionante, a taxa de desemprego permaneceu em patamares historicamente baixos. Além disso, foi possível praticar uma taxa de juros real abaixo dos 3% sem pressionar a inflação. Tal equilíbrio seria sustentável a médio termo?
Não, leitor, infelizmente. Imagina-se que a partir do último trimestre desse ano a economia já esteja em plena recuperação, respondendo assim aos incentivos fiscais e monetários implementados desde o ano passado. Em assim sendo, é prudente aguardar por pressões inflacionárias. Isso ocorrerá em um ponto já elevado, dada a ainda remanescente inércia (inflação passada) contida na inflação brasileira. Desse modo, e caso a autoridade monetária ainda esteja comprometida com o regime de metas, a taxa de juros real terá de se elevar até o ponto em que garanta a não aceleração inflacionária.
E quanto ao fenômeno do desemprego baixo e economia estagnada, devemos rasgar o manual? Não, ainda não. Tudo indica, pelos dados do mercado de trabalho, que ocorreram duas forças contrabalanceadoras à força principal que aumenta o desemprego no ciclo de baixo crescimento. A primeira é que, amparada no aumento de renda dos últimos anos, a população jovem ficou mais tempo nos bancos escolares, fazendo com que a População Economicamente Ativa (PEA) crescesse menos do que a População Ocupada. Em segundo lugar, dada a expectativa de retomada da atividade a partir do segundo semestre (defendida insistentemente pelo governo e pelo próprio Banco Central), os empresários decidiram adiar demissões. Essa atitude, como é notoriamente sabido, se explica pelo alto custo de demitir e, também, pela própria existência de menor oferta de trabalho em vários setores produtivos - principalmente nas carreiras mais técnicas.
Em assim sendo, o desemprego andou meio que esquizofrênico no atual ponto do ciclo econômico, o que traz ainda mais desafios para o crescimento brasileiro. Isto porque, se de 2003 a 2010 foi possível crescer justamente pelo emprego de mão de obra ociosa - a taxa de desemprego saiu de 12% para 5,3% - tal realidade não é mais possível hoje. Mais crescimento em um cenário de taxa de desemprego historicamente baixo exigirá muito mais do que apenas incentivos ao Consumo. Será necessário aumentar a produtividade da economia, via as já conhecidas receitas: educação, melhores instituições, mercado de crédito de longo prazo, infra-estrutura adequada etc.
Sem tais empreendimentos, a continuação do equilíbrio atual - baixo desemprego, inflação convergindo para a meta e taxas reais de juros baixas - é extremamente instável. O governo sabe dessa realidade e justamente por isso rompeu com anos de dogmas e ideologias, reiniciando o programa de concessões de estradas e ferrovias. Esperamos, para o bem da produtividade brasileira, que tais expedientes continuem e que as reformas estruturais há muito tempo aguardadas sejam finalmente postas em discussão no Congresso.