Explicando o juro neutro da economia brasileira

No Comentário de Conjuntura da semana passada, falei sobre os dilemas aos quais está submetido o Banco Central. A inflação tem se mostrado mais resistente do que o inicialmente diagnosticado pela autoridade monetária, o que exigiu uma mudança na comunicação. Sai a tal normalização parcial para uma normalização até o juro neutro. E aqui, temos uma questão bastante relevante: o juro neutro da economia é uma variável não observável, que deve ser estimada. Mais do que isso, quais seriam as variáveis que afetam o juro de equilíbrio? Nesse Comentário de Conjuntura apresentamos um modelo explicativo para o juro de equilíbrio da economia brasileira.

O juro neutro é aquele que equilibra poupança e investimento em uma economia com `hiato do produto` nulo e inflação igual à meta. Em uma pequena economia aberta sem restrições a mobilidade de capital e com ativos substitutos, a taxa de juros doméstica é igual a taxa internacional. Quando não é o caso, deve-se adicionar à taxa de juros internacional (r_t^{*}), o risco país (\gamma_t) e o risco cambial (\tau_t), de modo que:

(1)   \begin{align*} \bar{r_t} = r_t^{*} + \gamma_t + \tau_t  \end{align*}

Com base em 1, procuramos estimar um modelo descritivo para a taxa de juros de equilíbrio da economia brasileira. Para isso, vamos estimar o seguinte modelo:

(2)   \begin{align*} \bar{r_t} = \beta_0 + \beta_1 r_t^{*} + \beta_2 \gamma_t + \beta_3 \tau_t + \beta_4 D_{Teto} + \varepsilon_t,  \end{align*}

onde D_{Teto} é uma *dummy* que assume 1 a partir de dezembro de 2016 e 0 nos meses anteriores da amostra. \varepsilon_t é supostamente um *ruído branco*. Para estimar 2, vamos utilizar uma amostra entre janeiro de 2004 e maio de 2021, totalizando 209 observações. Vamos considerar como *proxy* para o juro neutro, o juro estrutural implícito nas expectativas do boletim Focus. O juro internacional será representado pela taxa de juros efetiva praticada nos Estados Unidos (**fed funds**), para o risco país vamos considerar o EMBI e para o risco cambial vamos considerar o **cupom cambial**, que leva em consideração a expectativa de desvalorização/valorização cambial dos agentes. Ademais, para estimar 2, vamos considerar o método de mínimos quadrados ordinários (OLS), mínimos quadrados em dois estágios (TSLS) e o método dos momentos generalizado (GMM).^[Os instrumentos utilizados são as quatro defasagens de cada uma das variáveis utilizadas.] O restante desse Comentário cuida da coleta/tratamento dos dados, bem como da construção dos modelos.

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A tabela a seguir resume a estimação do modelo pelos três métodos descritos acima. À exceção do risco cambial, todas as demais variáveis se mostraram estatisticamente significativa para explicar o juro de equilíbrio. Em particular, o modelo sugere que o risco país é relevante para explicar o juro neutro. Assim, quanto maior for a instabilidade do ambiente político econômico, maior será o risco país e, portanto, maior será o juro de equilíbrio da economia.

Explicando o juro neutro da economia brasileira
Variável Dependente: Juro Neutro
OLS TSLS GMM
(1) (2) (3)
Intercepto 3.11*** (0.19) 2.98*** (0.24) 3.64*** (0.45)
Juro Internacional 0.39*** (0.03) 0.39*** (0.04) 0.20* (0.10)
Risco País 0.01*** (0.001) 0.01*** (0.001) 0.005*** (0.001)
Risco Cambial 0.01 (0.01) 0.01 (0.02) 0.01 (0.01)
DTeto -1.89*** (0.13) -1.89*** (0.13) -1.29*** (0.25)
J-Test 14.04
J-Test (p-valor) 0.12
Observations 209 205 205
R2 0.73 0.72
Adjusted R2 0.72 0.71
Residual Std. Error 0.78 (df = 204) 0.78 (df = 200)
F Statistic 136.11*** (df = 4; 204) 128.73*** (df = 4; 200)
Nota: *p<0.1; **p<0.05; ***p<0.01

Outro resultado interessante que o modelo estimado sugere é que a dummy que representa o teto de gastos se mostrou igualmente relevante para explicar o juro de equilíbrio da economia.
____________________

(*) Para quem quiser ter acesso a todos os códigos desse e de todos os exercícios que publicamos ao longo da semana, visite o Clube AM.

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