O último Relatório de Inflação, divulgado pelo Banco Central, é otimista - até demais, para alguns - quanto à convergência dos preços para a meta em 4,5% no próximo ano. "Inovou" ao integrar o item "choque de oferta" aos componentes do IPCA, acha que o Governo Central irá cumprir a meta de superávit primário e confia nas medidas macroprudenciais muito mais do que na subida da taxa básica de juros para conter as pressões inflacionárias. Seria, assim, o fim do regime de metas inflacionárias no país?
O modelo de metas, na versão proposta por Svensson, defende que a autoridade monetária deve balizar as expectativas inflacionárias para um nível de preços condizente com o produto potencial da economia. O faz através da calibragem da taxa básica de juros, uma meta operacional, que guiará a meta intermediária, as expectativas de preços, rumo a estabilidade econômica. Está implícito nesse modelo, portanto, que a política monetária não causa crescimento de longo prazo, mas afeta apenas variáveis nominais nesse horizonte do tempo.
Em assim sendo, é impossível buscar um nível de câmbio, um de preços e outro de crescimento. O que quer o governo Dilma, portanto, não cabe no escopo do modelo de Metas de Inflação. Ou a política econômica tem uma meta implícita - ou explícita - para câmbio ou para preços ou para crescimento. Uma meta para os três seria a ausência de meta para todos. É como tentar tapar todas as goteiras de uma casa com apenas duas mãos: não se terá máxima eficiência em tapar todos e, portanto, todos vazarão.
O Banco Central intervém no mercado de câmbio, buscando impedir uma maior apreciação da moeda brasileira frente ao dólar. O problema é que fazendo isso, impede que se compense o efeito do aumento dos preços de commodities, que assim são repassados para os preços domésticos. De forma análoga, ao continuar com o aumento dos gastos públicos, não adianta aumentar os depósitos compulsórios e aumentar a exigência de capital dos bancos, tentando frear a demanda doméstica. Coerência e harmonia entre as diferentes políticas à disposição do governo são fundamentais para que se maximize o bem-estar social.
E assim, preocupam-se os economistas e analistas do mercado financeiro: até que ponto o regime de metas de inflação está comprometido? Por hora, não muito. Mas os riscos estão aumentando. Hoje, a inflação em doze meses se encontra muito próximo do teto da banda superior - que é de 6,5%. Em dezembro, seguramente, ela estará acima desse nível, caso o Banco Central não aprofunde a política monetária restritiva. E por que isto?
Já não há muito para onde correr: toda vez que temos um surto de crescimento - e isso já há mais de trinta anos! - há pressão inflacionária. Não qualquer pressão, mas uma aceleração contundente dos preços. E mesmo que haja mil teorias sobre a ainda presente indexação da economia, sobre os choques de oferta ou qualquer outro fator periférico não se pode negar que quando a ociosidade baixa, os preços aumentam e não se pode culpar um mero ciclo de estoques. São vários os problemas para expandir a oferta, que passam pela contratação de trabalhadores minimamente qualificados e terminam nas agruras do judiciário brasileiro.
O que fazemos, então? Jogamos uma vez mais para debaixo do tapete os problemas estruturais da nossa economia e tentamos equilibrar três metas com um único instrumento? Ou, de modo singular, enfrentamos nossos pesadelos? A História - e ao que parece somente ela, já que os eleitores... - julgará que caminho a Presidente Dilma tomará.