Como coletar dados de conjuntura do setor externo com Python

Toda e qualquer economia de mercado deve ter algum contato, menor ou maior, a depender de diversos fatores, com o resto do mundo. Convencionou-se, nesse contexto, a designar como setor externo a área da análise de conjuntura onde são compiladas e analisadas as transações comerciais e financeiras que são feitas entre residentes e não residentes de um determinado país. Neste artigo mostramos rotinas simples para analisar dados de taxa de câmbio e do balanço de pagamentos usando Python.

Coleta de dados de taxa de câmbio

Primeiro, vamos olhar para a taxa de câmbio, aquela que mostra o preço relativo entre duas moedas. No Python, podemos ver a taxa de câmbio R$/US$, através do pacote python-bcb:

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dolar
Date
2010-01-01 1.8748
2010-02-01 1.8110
2010-03-01 1.7810
2010-04-01 1.7306
2010-05-01 1.8167
... ...
2024-05-01 5.2416
2024-06-01 5.5589
2024-07-01 5.6621
2024-08-01 5.6562
2024-09-01 5.4481

177 rows × 1 columns

A forma acima, comum no Brasil, é chamada de forma direta, que expressa o quanto um dólar é cotado em real. Mas há também a forma indireta, onde poderíamos dizer o quando um real é cotado em dólar. Ademais, as taxas de câmbio também se apresentam em sua forma real, onde se leva em consideração a inflação dos países, isto é,

    \[\theta = \frac{E\pi^{est}}{\pi}\]

onde \theta é a taxa de câmbio, E é a taxa de câmbio nominal (vista acima), \pi^{est} é a inflação estrangeira e \pi é a inflação doméstica. Em outras palavras, o câmbio real nada mais é do que o câmbio nominal moderado pela razão entre a inflação estrangeira e a inflação doméstica.

A taxa de câmbio é uma variável endógena que depende de uma série de fatores para ser determinada. Essa determinação, por suposto, ocorre no mercado de câmbio, onde de forma geral bancos centrais podem atuar de modo a moderar a variabilidade da taxa. Isto é, bancos centrais tentam evitar variações muito bruscas, dado o efeito que isso possui sobre outras variáveis macroeconômicas, como a inflação.

Há nos livros-texto de macroeconomia aberta e economia internacional uma divisão clássica entre regimes cambiais, indo desde regimes de câmbio fixo até o câmbio flutuante, passando pelo regime mais utilizado hoje em dia que o de flutuação suja, descrito acima. Em particular, no regime de câmbio fixo, o Banco Central se compromete com uma determinada taxa de câmbio, comprando ou vendendo moeda estrangeira de modo a manter aquela taxa fixa. Implícito, portanto, está o fato de que o Banco Central precisa ter um elevado nível de reservas, bem como deve aceitar perda de graus de liberdade na condução da política monetária.

De forma geral, é uma tarefa bastante difícil manter uma taxa de câmbio fixa durante muito tempo, dado que existe um enorme conjunto de variáveis que exerce influência sobre seu nível. Esse é o motivo simples para que regimes de câmbio fixo foram praticamente abandonados ao redor do mundo.

Coleta de dados de swaps cambiais

O regime cambial no Brasil é o do tipo flutuação suja desde o final da década de 90. Recentemente, entretanto, ao invés de utilizar o estoque de reservas internacionais para moderar a variabilidade da taxa de câmbio, o Banco Central tem feito operações de swap, de modo a intervir no mercado.

Swaps são contratos que envolvem troca de (posição de) risco e rentabilidade. Swaps de juros, por exemplo, envolvem troca de taxas pré-fixadas (conhecidas, portanto, ex-ante) por taxas pós-fixadas (sujeitas à oscilações, portanto). Já os swaps cambiais envolvem troca de variação cambial por taxas de juros DI (pós-fixadas), equivalente, nesse aspecto, à venda de dólar no mercado futuro, dado que o Banco Central oferece ao investidor proteção contra oscilações da moeda, tornando desnecessária a compra de dólar. Há ainda os swaps cambiais reversos, que envolvem operação contrária à descrita anteriormente (troca de taxas de juros por variação cambial), sendo equivalente, portanto, à compra de moeda no futuro, dado que quem assume o risco da variação cambial é o investidor.

Tipicamente, o Banco Central faz venda de swaps cambiais quando há pressão por desvalorização do real frente o dólar, dado que visa ofertar proteção (hedge) aos investidores. O objetivo da operação, na prática, é deslocar a curva de oferta. O Banco Central ganha se a taxa de juros DI for superior à variação cambial. Já o swap cambial reverso ocorre em momentos de apreciação do real frente o dólar: daí a troca de juros por variação cambial, isto é, o Banco Central ganha se a variação cambial for superior à taxa de juros.

Dito isto, vamos dar uma olhada nessas operações? A seguir, importamos os dados de operações de swaps e construímos um indicador da relação demanda/oferta.

data_leilao oferta demanda
0 2024-05-22 12000 7000
1 2024-05-23 12000 3563
2 2024-05-23 12000 8437
3 2024-05-24 12000 6000
4 2024-05-24 12000 6000
... ... ... ...
90 2024-08-29 12000 9700
91 2024-08-30 12000 6870
92 2024-08-30 12000 5130
93 2024-08-30 30000 10700
94 2024-08-30 30000 4600

95 rows × 3 columns

Coletando dados de balanço de pagamentos

É no balanço de pagamentos (BP) que se registram as operações comerciais e financeiras feitas entre residentes e não residentes. De forma a manter a didática, o BP pode ser dividido em duas grandes contas: as transações correntes e a conta financeira e de capital. Naquelas ficam registradas as exportações e importações de bens e serviços, além de remuneração aos fatores de produção e transferências unilaterais, enquanto nesta ficam as transferências financeiras.

As transações do BP são registradas pelo sistema de partidas dobradas, isto é, toda transação é registrada duplamente: como crédito e como débito. Ou seja, todo uso de moeda estrangeira precisa ter uma fonte de moeda que o financie. É por isso que o equilíbrio do balanço de pagamentos é um equilíbrio meramente contábil. Ou seja, a soma de todas as contas do BP será sempre nula, de modo que o mesmo estará sempre em equilíbrio. Em outras palavras,

    \[BP = TC + K = 0\]

O que o analista de conjuntura terá interesse, portanto, não é no saldo do BP, mas na trajetória das suas parcelas, as transações correntes e a conta capital e financeira. Como exemplo, observe que o sistema de partidas dobradas implica que países que apresentam saldo negativo nas transações correntes deverão ter, necessariamente, saldo positivo na conta capital e financeira. Isso significa que os mesmos estão se tornando devedores em relação ao resto do mundo.

De modo a melhorar nosso entendimento sobre o BP, é propício ampliar a discussão contida em na Equação 1, abrindo assim a conta capital e financeira em movimentos de capitais autônomos e movimentos de capitais compensatórios, estes representados em geral pela variação de reservas internacionais, isto é,

    \[TC + K + \Delta H &= 0\]

    \[\text{Como} - \Delta H &= \Delta R\]

    \[TC + K &= \Delta R\]

Onde - \Delta H = \Delta R é a variação de reservas.

O movimento de capitais autônomos ocorre em função de decisões de agentes residentes e não residentes, enquanto o movimento de capitais compensatórios tem a ver com decisões do Banco Central. Essas são realizadas, principalmente, em função de intervenções da autoridade monetária no mercado de câmbio.

A Equação 2 representa, nesse contexto, o resultado do balanço, indicando a direção dos desequilíbrios. Em outras palavras, o aumento de reservas significa que a oferta de moeda estrangeira está maior do que a demanda, enquanto uma redução implica o contrário.

O acompanhamento do balanço de pagamentos por parte do analista de conjuntura se dá, de maneira geral, através de alguns indicadores-chaves, como o o saldo de transações correntes em relação ao PIB e a razão de investimento direto no país em relação ao PIB. Esses indicadores em particular mostram como está o déficit externo (o uso de poupança externa) e como esse déficit está sendo financiado com capital produtivo. Abaixo colocamos a evolução dos dois:

Transações Correntes Investimento Direto no País
Date
2010-01-01 -1.96 1.88
2010-02-01 -2.20 2.02
2010-03-01 -2.50 2.17
2010-04-01 -2.77 2.10
2010-05-01 -2.88 2.25
... ... ...
2024-04-01 -1.08 3.07
2024-05-01 -1.24 3.01
2024-06-01 -1.42 3.21
2024-07-01 -1.49 3.23
2024-08-01 -1.75 3.19

176 rows × 2 columns

A evolução desses e de outros indicadores, como o estoque de reservas internacionais, e os de endividamento darão uma dimensão sobre como está a economia de um determinado país em relação ao resto do mundo. Isto é, se a sua posição externa está adequada. Afinal, como diria o economista Mario Henrique Simonsen, o balanço de pagamentos é mortal para uma economia.

Conclusão

Toda e qualquer economia de mercado deve ter algum contato, menor ou maior, a depender de diversos fatores, com o resto do mundo. Convencionou-se, nesse contexto, a designar como setor externo a área da análise de conjuntura onde são compiladas e analisadas as transações comerciais e financeiras que são feitas entre residentes e não residentes de um determinado país. Neste artigo mostramos rotinas simples para analisar dados de taxa de câmbio e do balanço de pagamentos usando Python.

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