O Exame da Anpec é uma prova de seleção para mestrados em Economia. Nessa semana, a propósito, a CAPES divulgou a avaliação quadrienal da pós-graduação no país. Esses dois eventos me motivaram a escrever um pouco sobre mestrados em economia. Nas linhas que seguem, faço um comentário sobre alguns mestrados que conheço, seja por ter pesquisado sobre os mesmos na época em que fiz a prova da Anpec, seja porque conheci alunos e professores desses programas. É, por suposto, um relato bastante pessoal, de alguém que preferiu seguir o mainstream na sua dissertação, voltada para política monetária. Feita a ressalva, vamos aos comentários.
Antes de mais nada, gostaria de comentar a nota da CAPES voltada para economia. Há muitas ressalvas que poderiam ser feitas a essa avaliação, mas esse não é o ponto aqui. Vou apenas tecer uma breve descrição sobre as notas, que variam de 3 a 7. Entre os programas em economia com nota máxima (7), estão: EPGE (FGV Rio), EESP (FGV SP), PUC-Rio e USP. Para quem vai fazer o Exame da ANPEC, ter acesso a essas escolas implica em ficar nas 60 primeiras colocações, o que inclui boa performance nas provas de macroeconomia, microeconomia, matemática e estatística. Isso mesmo, nada de economia brasileira. Cada uma dessas provas tem peso de 25% na nota final do aluno. São programas com forte viés mainstream, que proporcionarão contato com ótimos professores, ótimos alunos e boas perspectivas de fazer doutorado no exterior (ou obter um bom emprego, por que não, após o término do curso).
Com nota 6, estão os seguintes programas: UFF, UFMG, UNB, UCB e UFRJ. Conheci a UCB em 2015, por intermédio de uma palestra que realizei por lá. Mas não conheço o programa de pós-graduação, logo não posso comentar a respeito. O mesmo para a UFMG. A UNB, por sua vez, eu conheço por intermédio dos seus alunos e alguns professores. Todos muito bons. Destaque aqui para a ênfase em pesquisas voltadas para economia do setor público. As duas restantes, comento a seguir.
Sou suspeito para falar sobre a UFRJ e sobre a UFF, fica o alerta de antemão. Estudei nas duas escolas e posso falar um pouquinho sobre elas. Na UFRJ, eu destacaria dois núcleos: economia industrial e economia da energia. O IE é conhecido pela qualidade dos professores na área de economia industrial, então, falar sobre isso é meio que chover no molhado. Para quem quer aplicar conceitos de industrial na área de energia, lá também tem um dos principais grupos de pesquisa na área do país. Para macroeconomia, uma observação importante, o mainstream anda meio solitário por lá, então se esse é o seu objetivo, melhor pesquisar antes de ir.
Deixei a UFF por último lugar por questões óbvias - fui aluno do mestrado. O programa já merecia a avaliação há algum tempo, e não é surpresa para quem o conhece que tenha, enfim, chegado lá. Os destaques do programa são as áreas de macroeconomia e desigualdade. Em ambas, você encontrará bons orientadores para desenvolver sua dissertação em macroeconomia aplicada e temas de microeconomia aplicada voltados para desigualdade, com amplo uso de econometria. Um último ponto que gostaria de chamar atenção é que muita gente ainda acha que a UFF seja um centro marxista. Isso não é mais verdade. A pesquisa nessa área está concentrada em três, quatro professores no máximo. Logo, você terá uma boa formação mainstream por lá.
Entre os programas com nota 5 ficaram: UFPE, UFPR, UFRGS, UFSC, UFV, Unicamp, USP-ESALQ e USP-RP. Dessas, conheço alunos e/ou professores da UFRGS, USP-ESALQ, USP-RP e Unicamp. Na UFRGS, você poderá se desenvolver muito bem em macroeconomia aplicada, com forte aplicação de técnicas econométricas. NA ESALQ, há um forte viés em economia agrícola, por questões óbvias. Conheço muitas pessoas que passaram por lá e foram trabalhar no mercado de commodities. A USP-RP, por sua vez, tem um programa mais micro, ligado também a questões mais aplicadas. E a Unicamp é a Unicamp, acho que todo mundo conhece o viés de lá. Sem comentários.
Entre os programas com nota 4 destacaria a UFC, seja por já ter palestrado por lá, seja por conhecer diversos alunos e professores (que fizeram os cursos da AM). É um bom programa, com boas pesquisas sendo produzidas na área de macroeconomia aplicada. Certamente, deve avançar nos próximos anos, alcançando melhor pontuação na avaliação da CAPES. Os demais programas com essa nota eu não conheço, logo não posso comentar a respeito.
Uma dúvida muito comum entre os alunos é se dá para fazer um bom mestrado fora do eixo FGV-USP-PUC/RJ. A minha resposta é um sonoro sim. Entre os programas com nota 4 a 6 que comentei acima, certamente você poderá obter uma boa formação, ter um bom orientador e produzir uma dissertação de qualidade. Poderá também acessar um bom programa de doutorado ou ir direto para o mercado de trabalho, sem grandes dificuldades. Uma única ressalva é se você quiser fazer doutorado fora. Fora do eixo FGV-USP-PUC/RJ isso é mais raro de ocorrer. Então, se esse é o seu objetivo, seria bom ponderar em tentar novamente o Exame da Anpec em outra oportunidade, focando nessas escolas. Se o seu objetivo é trabalhar depois, qualquer um dos mestrados citados poderá lhe servir.
Gostaria de fazer, por suposto, um breve comentário sobre o mestrado em si, seja qual for o programa que você escolher. E aqui o relato é mais pessoal. No meu caso, a experiência foi maravilhosa. Pude criar um grupo de pesquisa focado em análise de conjuntura que mais tarde serviria de inspiração para criar a Análise Macro, tive contato com diversos professores de outras universidades, por meio do Encontro da ANPEC, realizado no final de cada ano (que eu recomendo fortemente que você vá!), tive aulas aplicadas sobre coisas que gostaria de estudar em macroeconomia, bem como pude apresentar uma dissertação em política monetária usando um monte de coisa bastante inovadora para a época. Foi uma época muito legal na minha vida, onde pude conhecer inúmeras pessoas e assistir a um monte de seminários. Ah, sim, e beber muita cerveja no bar da esquina, para comemorar as boas notas ou chorar as frustrações da vida de mestrando...
Recomendo fortemente que você leve o seu mestrado a sério. Caso ainda não saiba qual área lhe apetece em economia, o mestrado pode ser uma ótima oportunidade de se descobrir. Estude muito a teoria que será ensinada em sala de aula, mas também procure desde o primeiro semestre a ler papers. Aproveite o acesso aos periódicos da CAPES para poder ler o máximo de artigos que puder. Participe dos seminários da sua faculdade. Organize alguns se puder. Crie um grupo de pesquisa sobre o tema que deseja se dedicar. E sobretudo aproveite esse tempo para melhorar seus skills em coleta, tratamento, análise e apresentação de dados. Isso mesmo: procure desde o início a trabalhar com bases de dados, com evidência empírica. Isso implica em aprender econometria e alguma linguagem de programação. Quanto antes você resolver isso, menos você sofrerá para preparar uma boa dissertação.
Por fim, divirta-se! O mestrado em economia não é a coisa mais fácil que você irá fazer na vida. Vai doer e se não doer é porque você não está fazendo direito. Mas vale muito a pena!