...E economistas não tão sérios assim, leitor. Foi o que pensei no instante que terminei de ler o belo artigo de Raghuram Rajan, traduzido para o Valor Econômico da última sexta-feira, como "o estilo paranóico em economia". O texto faz uma análise sobre a necessidade que os economistas têm de brigar uns com os outros pela verdade de seus argumentos. E eu, como bom representante da profissão, vez ou outra acabo cedendo à tentação de "criticar a crítica", usando o termo "economistas sérios" (nós) para taxar implicitamente que existiriam economistas não tão sérios assim. A alcunha, a bem da verdade, não é minha: roubei honestamente de outros economistas que assim também agem. Lendo o artigo do Rajan, fica a pergunta: existem economistas que não são sérios?
O adjetivo sério aqui, a bem da verdade, não tem sido utilizado com muita parcimônia e mesmo auto-crítica. Sérios, para ir direto ao ponto, são os economistas que acreditam na neutralidade da moeda, na condução via regras da política econômica, na austeridade fiscal e no produto potencial. Acreditar, não no sentido de "fé", mas no sentido de "dar crédito" a essas ideias, com base na metodologia positiva, com base na falseabilidade de tais argumentos, com base na refutação empírica. Economistas sérios, leitor, olhariam para os dados e, no caso específico deles não dizerem nada o contrário (daí a ideia de falseabilidade e não "comprovação empírica", como muitos bons economistas confundem às vezes), poderíamos continuar dando crédito às afirmações que o sustentam.
Por exigência do contraditório, economistas não sérios seriam todos aqueles que não passam por esse julgo: os dados às vezes confessam, mas o que importa, não é mesmo?
Nesse caso específico, mesmo que, por exemplo, a economia brasileira já esteja careca de saber, com base em tudo o que já se fez nessa seara, o que custa tentar ressuscitar alguma espécime do ecletismo keynesiano-estruturalista?
Afinal, sempre é possível um pouquinho mais de inflação em troca de um trocado a mais de crescimento, não é mesmo? Se é necessário um pouquinho mais de inflação, paciência não é mesmo?
Tudo bem, leitor, pode ser que eu esteja sendo irônico demais, testando sua fulgaz paciência. Economistas sérios, afinal, tem de ter uma dose de um humor um tanto quanto refinado para aturar, no sentido de suportar, o imenso custo que esse tipo de ideia pode custar à macroeconomia de um país. Isto porque, um pouquinho mais de inflação geralmente se transforma em inflação em estrito crescimento. A troca entre crescimento e essa coisa chamada inflação não é possível porque as pessoas sempre buscarão defender seus respectivos poderes de compra. Nesse processo de defesa, gerarão a inflação do período seguinte: muito maior, diga-se, do que a do período que já foi. Pronto: a troca entre crescer e inflacionar obteve um vencedor, não é mesmo?
E como dizem os economistas sérios, isto não é fruto da crença, mas da falseabilidade dos dados: ou seja, o fato empírico tende a concordar com a cadeia de eventos posta acima. Ainda que, longe de um positivista afirmar isso, não seja possível tirar conclusões a partir do empírico - e nesse ponto específico, nós andamos de mãos dadas com o povo da dialética, veja você, leitor amigo.
No mais, eu tendo a concordar com Rajan, que há muita briga pessoal em detrimento a brigas por argumentos. Mas, como aquelas não me interessam, tendo a me concentrar nestas. E sobre estas, desculpa Rajan, mas eu tendo a ficar do lado dos economistas sérios. Eles parecem ter maior credibilidade do que o lado oposto.
O artigo do Rajan pode ser lido aqui.