Política Monetária e Inflação

taxadejurosrealÉ um momento importante para a história monetária brasileira. Após reduzir a taxa básica de juros para 7,25%, o Banco Central teve de reverter o processo, elevando-a novamente para 11% na última reunião. O motivo é simples: a redução da taxa de juros para sua mínima histórica fez acelerar a inflação. Desse modo, mostrou-se, uma vez mais, que juros reais baixos dependem de ações concretas e não de voluntarismo político.

O gráfico acima ilustra o processo. As linhas pontilhadas representam taxas de juros reais (Selic e Swap pré-DI, deflacionadas pela expectativa de inflação). A taxa Selic real saiu de 7% em agosto de 2011 para 1,5% em janeiro de 2013. Com efeito, a inflação medida pelo IPCA chegou a 6,7% em junho de 2013. Importa ressaltar que a relação entre taxa de juros e inflação ocorre com defasagens, isto é, entre o processo de ajuste na taxa nominal e o seu efeito sobre os preços vão se alguns trimestres.

A condução da política monetária, nesse contexto, deve observar o que os economistas entendem como taxa de juros neutra. Isto é, o ponto onde a taxa de juros real não gera pressão inflacionária. De acordo com metodologia do Fundo Monetário Internacional a “região de juro neutro” estaria entre 4,5% e 5,5% para o Brasil.[1] Esse intervalo está sublinhado no gráfico. Pode-se inferir, desse modo, que juros reais abaixo de 4,5% configuram uma política monetária expansionista, enquanto acima de 5,5% contracionista.

Novamente pelo gráfico pode-se observar na região retangular que a política monetária brasileira foi expansionista durante os últimos dois anos. Só agora, em março de 2014, que a Selic real entrou na região de juro neutro, com 4,6% na média mensal. O Swap pré-DI, para efeito de comparação, registrou 5,3% no mesmo período. Não por outro motivo, a inflação medida pelo IPCA tem-se mostrado bastante resistente, estando sistematicamente acima da meta de 4,5%.

Nesse contexto, para que a política monetária fosse efetiva no controle da inflação, ela deveria romper a zona de juro neutro, ficando durante alguns trimestres acima de 5,5%. Com juros nominais em 11%, por exemplo, a inflação se mantém acima da meta até 2016, como o próprio Banco Central mostra em suas projeções. Em um exercício simples, para trazer a inflação para 4,5% em até oito trimestres, a taxa de juros real deveria estar em 8,5%. É o preço por ter mantido a política monetária em terreno expansionista durante tanto tempo.

De forma alguma, entretanto, o Banco Central promoverá um ajuste dessa envergadura. É o que se depreende de sua comunicação com o mercado. Na ata da 177ª reunião (5/9/13) iniciou indicações de que o fim do ciclo de aumento estava próximo ao sublinhar o papel neutro da política fiscal. Na da 179ª reunião (05/12/13) informou sobre as defasagens envolvidas no processo. Na 181ª reunião (25 e 26/02/14) reduziu o ritmo de ajuste, para 25 p.b. e agora, na 182ª retirou a expressão “dando prosseguimento” e incluiu o “nesse momento”; sublinhando a dependência em relação aos dados para continuar ajustando os juros. É uma indicação forte de que a taxa nominal não irá muito além dos 11% ao ano.

Em assim sendo, a despeito do aumento de 375 p.b. nos juros, a inflação continuará acima da meta pelo quinto ano consecutivo. Com efeito, as expectativas não convergem para 4,5% nem em 2018. Para que possamos enfrentar esse problema, a autonomia da autoridade monetária precisa ser restabelecida, bem como aprovadas as reformas que podem destravar a oferta de bens e serviços. Sem isso, preços surreais nos aguardam durante toda a década.

 


[1] To cut or not to cut? That is the (Central Bank´s) question. IMF Working paper nº 12/243.

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Tratamento e transformação de séries temporais macroeconômicas para modelagem

"Garbage in, garbage out" é a regra de ouro na previsão macroeconômica. Antes de aplicar qualquer modelo de IA ou econometria para prever indicadores como o IPCA ou o PIB, existe um trabalho crucial de tratamento de dados. Neste post, abrimos os bastidores do nosso dashboard de previsões e mostramos o passo a passo para transformar dados brutos de múltiplas fontes (como BCB, IBGE e FRED) em séries prontas para modelagem. Veja como lidamos com diferentes frequências, aplicamos transformações e usamos metadados para criar um pipeline de dados robusto e automatizado.

Como planejar um pipeline de previsão macroeconômica: da coleta ao dashboard

Montar um pipeline de previsão macroeconômica não é apenas uma tarefa técnica — é um exercício de integração entre dados, modelos e automação. Neste post, apresento uma visão geral de como estruturar esse processo de ponta a ponta, da coleta de dados até a construção de um dashboard interativo, que exibe previsões automatizadas de inflação, câmbio, PIB e taxa Selic.

Coletando e integrando dados do BCB, IBGE e IPEA de forma automatizada

Quem trabalha com modelagem e previsão macroeconômica sabe o quanto é demorado reunir dados de diferentes fontes — Banco Central, IBGE, IPEA, FRED, IFI... Cada um com sua API, formato, frequência e estrutura. Esse gargalo de coleta e padronização consome tempo que poderia estar sendo usado na análise, nos modelos ou na comunicação dos resultados.

Foi exatamente por isso que criamos uma rotina de coleta automatizada, que busca, trata e organiza séries temporais econômicas diretamente das APIs oficiais, pronta para ser integrada a pipelines de previsão, dashboards ou agentes de IA econometristas.

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.