A ata do Copom e um pouco de DSGE

Ontem, conversando com alguns estudantes de economia, fui perguntado sobre o por quê do Banco Central ter de continuar aumentando a Selic, dado o baixo crescimento da economia. Algo que deixei nas entrelinhas aqui. Os estudantes perguntaram, corretamente, se o fato do hiato do produto estar em campo negativo, não seria acertada a iniciativa do Copom em parar o processo de aumento. É uma questão interessante que trato brevemente a seguir.

No modelo estrutural de quatro equações básico - e sem microfundamentação - que a gente aprende lá na graduação, o hiato do produto no terreno negativo é verificado via curva IS. Esse hiato afeta a inflação via curva de phillips, o que é uma pressão a menos dado o baixo crescimento. Ocorre que tomada uma curva de phillips como a abaixo, deveria-se levar em consideração as expectativas dos agentes. Essas se encontram descoladas, dado principalmente o realinhamento entre preços livres e administrados que ora se verifica na economia brasileira.

curva

Mas não é apenas isso. Se avançarmos um pouco na teoria e considerarmos os modelos DSGE, onde as equações estruturais que representam a economia são explicitamente derivadas do comportamento otimizador dos agentes, a curva de phillips ganha "nova" formatação, como a retirada abaixo de Walsh:

curvank

Onde o segundo termo do lado direito representa o custo marginal real das empresas, que é um nome pomposo para representar a diferença entre as taxas de crescimento dos salários reais e da produtividade. Ou seja, o que importa para gerar pressão real - se me permitirem usar o termo - sobre os preços é o quanto salários e produtividade estão descolados.

E por que chamar atenção para isso? Apenas sob determinadas condições o segundo termo do lado direito da equação acima pode ser substituído pelo hiato do produto como conhecemos - ver Walsh, página 336 em diante. Desse modo, na conjuntura atual, com a combinação - perversa - entre baixo crescimento e baixo desemprego - este tratado aqui -, o que verdadeiramente importa para verificar a pressão sobre os preços é justamente o comportamento dos salários reais vis a vis o da produtividade - como bem ressalta o próprio Copom em suas atas.

Bom, leitor, agora junte as duas peças do problema. A diferença entre salários reais e produtividade mais as expectativas deterioradas deveriam significar algo para o Comitê, correto?

Pois é. Além disso, com esse tipo de bengala, dá para explicar mais claramente o por quê mesmo com o hiato do produto em terreno negativo, convive-se com inflação alta e resistente. A verdadeira medida de custo marginal real para as empresas deve ser buscada no mercado de trabalho, que anda do jeito que a gente conhece, não é mesmo?

E agora, deixo para você: o Copom acertou, errou ou você é indiferente? 🙂

 

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