Atraso na elevação dos juros aumentou os custos de desinflacionar a economia brasileira

Uma das relações mais estudadas e debatidas dentro da ciência econômica é aquela entre inflação e desemprego (ou crescimento). Com a estagflação da década de 70, o princípio aceleracionista de Friedman-Phelps ganhou relevância, passando a ser a principal referência quando o assunto é essa relação, conhecida como Curva de Phillips. Neste conceito está embutida a ideia de que existe uma taxa de desemprego considerada natural (NAIRU), compatível com a não-aceleração da taxa de inflação. Em outros termos, qualquer outra taxa de desemprego implica em variabilidade maior ou menor da taxa de inflação. Olhando para a conjuntura econômica brasileira, onde a massa salarial está crescendo mais do que a produtividade (sintoma de que a taxa de desemprego efetiva está abaixo da NAIRU), a omissão da autoridade monetária em utilizar o instrumento convencional aumenta consideravelmente os custos de desinflação. Por quê?

Em termos teóricos, quando a taxa de desemprego efetiva é mantida por tempo suficientemente prolongado abaixo daquela considerada natural, haverá elevação da variabilidade da taxa de inflação. Em assim sendo, para trazer a economia de volta para a NAIRU, a autoridade monetária deverá elevar a taxa de juros nominal para um patamar suficiente para que a taxa de juros real se situe próximo a taxa de juros natural - está também condizente com a NAIRU. Ou seja, quanto maior for o tempo de reação, maior será o nível de inflação que deve ser combatido, logo maior a taxa nominal de juros que deve ser perseguida para que o nível de equilíbrio macroeconômico seja retomado.

Visto isso, vamos aos dados da economia brasileira. O primeiro ponto: a taxa de desemprego efetiva está abaixo da natural? Como já chamei atenção aqui, uma forma de verificar isso é plotando em um mesmo gráfico o comportamento dos salários vis a vis o da produtividade do fator trabalho. Isso é feito abaixo. Salários crescendo mais do que a produtividade indicam que a taxa de desemprego efetiva está descolada da natural, ponto onde, por definição, ambas as séries cresceriam a mesma taxa.

massasalarial

Considerado esse primeiro ponto, vamos à inflação: ela está em aceleração? Isso é bastante simples de verificar. Basta verificar duas coisas. A primeira: o índice que mede a inflação está aumentando no acumulado em 12 meses? A segunda: esse aumento é difundido ou é apenas fruto de choques isolados? Se for apenas choques isolados, toda a tese aqui construída cai por terra: do contrário, estaremos no caminho sugerido no primeiro parágrafo. Os dois próximos gráficos ilustram o comportamento desses dois pontos em relação à inflação.

ipca

difusãoipca

Ambas as séries, difusão e índice cheio, mostram que, de fato, há um processo disseminado de aceleração inflacionária. Um pequeno detalhe sobre o índice de difusão, antes de prosseguirmos. É possível perceber ele tem diminuído nesse início de ano. Isso não seria sintoma de um recuo do processo inflacionário, mas está diretamente ligado com o comportamento cíclico da economia ao longo do ano, como mostrei aqui. Ou seja, a perspectiva é que no segundo semestre a variação mensal volte a mostrar maior vigor, impactando diretamente no acumulado em 12 meses, caso não haja contra-tendência.

Explicada a teoria e mostrado os dados que comprovariam esse processo dentro da conjuntura econômica brasileira, falta tocar no ponto principal do post: os custos. O título do post chama atenção para os mesmos, alegando que estes aumentaram diante do atraso na reação do Banco Central. Como verificar isso? Novamente, o processo é simples. Sabendo que a taxa natural de juros está próxima de 5% (dados do FMI), a taxa nominal de juros deve superar a inflação esperada para os próximos 12 meses, fazendo com que a taxa real se iguale a essa taxa natural. Ou seja, mais inflação, mais juros, maior o custo de desinflacionar. Considerando uma expectativa de inflação para os próximos 12 meses em 5,8%, a taxa nominal deveria estar próxima de 11% para que a taxa real se situe naquela região de 5%.

Essa taxa seria a necessária para que o desemprego efetivo se desloque para próximo da NAIRU. Em outros termos, mais inflação, mais juros, maior o desemprego necessário para fazer a economia convergir para uma situação de não aceleração inflacionária. Atualmente, considerando o swap pré-DI 360 de 14/06 e a expectativa média de inflação de maio para 2013, a taxa real de juros encontra-se próxima de 3% a.a. Ou seja, há um longo caminho para a taxa Selic: o orçamento de alta situa-se próximo a 375 pontos-base, considerando que o patamar inicial era de 7,25%.

Obviamente, ele seria (o orçamento) muito menor, caso a elevação tivesse ocorrido antes. Nesse sentido, quando economistas não alinhados pediam no final de 2012, uma tomada de postura do Banco Central, era o custo do atraso que estava em suas cabeças. Diante de um processo eleitoral em curso prematuro, terá a autoridade monetária autonomia para dar conta dessa elevação? É uma pergunta para a qual, infelizmente, nenhum economista tem resposta. Isto porque, decisões políticas são difíceis de modelar...

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Como tratar dados no Python? Parte 4: operações por grupos

Como mensalizar dados diários? Ou como filtrar os valores máximos para diversas categorias em uma tabela de dados usando Python? Estas perguntas são respondidas com os métodos de operações por grupos. Neste tutorial mostramos estes métodos disponíveis na biblioteca pandas, que tem como vantagem sua sintaxe simples e prática.

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.