Novas informações sobre a condução da política monetária

O Gilmar Moschem me fez duas perguntas nos comentários desse post aqui.  Diante das novas informações, pergunta Moschem, a probabilidade de mais um corte de 25 pontos-base se torna relevante? Além disso, os ganhos em termos de inflação com os cortes na energia elétrica poderiam ser compensados pelo aumento nos combustíveis? Respondo a essas duas questões fazendo algumas considerações sobre a condução da política monetária daqui para frente.

A ata da 169ª reunião do Copom sinaliza no já tradicional elucidante parágrafo 35 que:

"Diante do exposto, considerando os efeitos cumulativos e defasados das ações de política implementadas até o momento, que em parte se refletem na recuperação em curso da atividade econômica, o Copom entende que, se o cenário prospectivo vier a comportar um ajuste adicional nas condições monetárias, esse movimento deverá ser conduzido com máxima parcimônia".

O mercado entendeu que o "máxima parcimônia" significa corte de 25 pontos-base. Daí que alguns acreditam que o cenário prospectivo para a inflação possibilitará esse corte, outros não. Para os primeiros pesam dois fatos: o cenário externo continuará difícil e a economia brasileira não crescerá de forma tão brilhante nos próximos períodos. Em assim sendo, o impacto sobre a inflação seria limitado, possibilitando que a taxa básica chegasse a 7,25% a.a.

Os que acreditam que o cenário não seria condizente com mais um corte acenam para certa recuperação do nível de atividade, dados os impulsos fiscais e monetários acumulados desde o ano passado, vis a vis o baixo nível de ociosidade existente no mercado de trabalho. Além disso, o espaço externo teria ficado comprometido dado algum choque de oferta advindo dos preços de commodities. A combinação de ambos levaria o Copom a interromper o afrouxamento monetário em 7,5% a.a.

Certamente que ambos os lados possuem algum grau de razão. A crise europeia é de difícil resolução em curto prazo, os EUA passam novamente por um processo de impasse fiscal - que pode custar alguns pontos na recuperação - e a China se mostra menos resiliente do que se supunha no início do ano. Observo, porém, que os choques de oferta advindos da seca nos EUA são passageiros e que apesar de necessitarem de acompanhamento, não devem prejudicar os preços domésticos em grau suficiente para assustar a autoridade monetária. A maior incógnita, ou seria aqui a variável-chave do problema, é mesmo o grau de recuperação da economia brasileira nos próximos trimestres.

Particularmente observo que as bases da provável recuperação são bastante frágeis. O nível de endividamento das famílias não permite que vislumbremos uma expansão mais firme do consumo, o que tem severos impactos sobre a disponibilidade de investir das empresas. A ocupação do nível de ociosidade passa a dar o tom haja visto que o desmonte da estratégia adotada em larga escala por várias indústrias, isto é, substituição de insumos nacionais por importados e elevação da obtenção de rendas financeiras , tende a ser maturada apenas se o câmbio mais depreciado e algumas reformas estruturais se consolidarem. Isto, claro, leva tempo  e não deve ser considerado para efeitos de curto prazo.

Em se ponderando essa fragilidade, adianto que a recuperação a partir do 4º trimestre parece ser mesmo algo a se verificar. E nessas bases, o mercado de trabalho parece mesmo ser a peça fundamental na resposta. Os ganhos reais de salários continuam, dado esse descompasso entre crescimento da PEA e da População Ocupada - que permitem manutenção da população desocupada em níveis bastante baixos. Tal cenário seria compatível com uma nova rodada de redução de juros?

A teoria de política monetária considera que uma taxa de juros real abaixo daquela que seria condizente com a inexistência de pressões inflacionárias é precisamente o que define uma política monetária expansionista. Nós já estamos nesse nível há um bom tempo, lidando com uma baixa ociosidade no mercado de trabalho, mas verificando que os canais normais de transmissão não estariam digamos devidamente azeitados. É esse "azeitamento", se é que podemos tratar a questão nesses termos, que explicam porque a autoridade monetária continuou o processo de ajustamento dos juros. Particularmente, prefiro essa resposta a uma suposta interferência política na autoridade monetária.

Até porque tais autoridades sabem que reduzir os juros sem bases técnicas para isso apenas adia o problema. Isto é, uma redução dos juros mal assentada agora pode gerar um maior aumento já no próximo ano, o que tem implicações fortes em termos políticos. Nesse sentido, o afrouxamento monetário foi feito dado o claudicante cenário externo e os problemas de transmissão verificados internamente. Tal processo possibilitou a redução de juros e o normal agora seria sentar e aguardar pelos desdobramentos que se seguirão sobre a economia. Em outros termos, uma nova redução de 25 pontos-base só faz sentido se houver algum evento novo no horizonte que ou indique uma recuperação nanica do nível de atividade ou que o cenário externo se complique em muitos graus.

É sempre bom lembrar que a inflação em 12 meses teve alguma piora nos últimos dois meses, indicando que a convergência para o centro da meta indicada no cenário base do Banco Central ficou um tanto quanto comprometida. Em assim sendo, caso haja persistência de efeitos nos índices de preços nesse mês de setembro, derivado de choques pontuais, há mais um elemento a ser considerado pela autoridade monetária no que tange a aceitar um nível de inflação anual acima de 5% em um momento de nível de atividade bastante frágil. Não vejo porque insistir agora, dado que o preço deverá ser pago mais a frente - como bem indica a boa teoria macroeconômica. Isto significa que os elementos pesam a favor de uma parada técnica em 7,5% a.a. salvo algum evento interno ou externo extraordinário - QE3, inclusive.

Já a segunda questão do Gilmar, é um tanto quanto mais delicada de se abordar. A História registra o quanto as estatais desse país ajudaram a política econômica em vários momentos. Seria a hora de dar o retorno? Bem sabe que uma hora ou outra o governo terá de dar o espaço necessário para o aumento da gasolina. O corte na energia elétrica seria aquilo que faltava para trocar seis por meia dúzia? Ou seja, trocar o corte das tarifas por aumento no combustível, neutralizando qualquer efeito sobre os preços?

Digo que é delicado porque há muitas forças dentro do governo. Mas penso que a linha mestra é mesmo sustentar um nível de juros mais baixo. A presidente parece mostrar grande empenho em entregar em 2014, ano em que terá de duelar tanto com a oposição quanto com o próprio PT, um nível de taxa básica condizente com padrões internacionais. E para isso, vem empreendendo iniciativas bastante díspares das ostes de seu partido. Nesse sentido, penso que sim, há espaço para algum reajuste nos combustíveis, mas que este se vir, ficará abaixo do impacto deflacionário da redução das tarifas de energia. O saldo, acredito, tenderá a ser positivo para o controle de preços. Além, é claro, de outras ideias e ferramentais que parecem estar sendo estudadas pelo ministério da fazenda.

 

 

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