Um Banco Central que não sabe se comunicar

Confesso que me causou estranheza ler no Valor de hoje a entrevista do diretor de assuntos internacionais do Banco Central, Luiz Awazu. A ideia do economista era defender a complementariedade entre a não redução da taxa básica de juros (anunciada na última ata do Copom) e as medidas macroprudenciais anunciadas no dia seguinte. A minha surpresa não foi em função da defesa da complementariedade das medidas, algo que eu apontei aqui e é bastante conhecido por quem estuda política monetária, mas sim a ambiguidade da comunicação do banco nos últimos anos. Explico a seguir o porquê.

De fato, tem sido difícil entender o que quer o Banco Central. Nesse caso específico, para não me alongar muito, o diretor Luiz Awazu contraria o que escreveu o próprio banco no parágrafo 27 da ata da 155ª reunião do Copom. Nesta lê-se, em linhas esclarecedoras, que "O Comitê ressalta que há certa equivalência entre ações macroprudenciais e ações convencionais de política monetária e que a importância desse vínculo tende a crescer com o aprofundamento do mercado de crédito, fenômeno este observado no Brasil nos últimos anos". Na época a minha crítica particular (e do mercado, em geral) foi justamente pela adoção do termo "certa equivalência". A literatura não reconhece a ideia de que medidas macroprudenciais tenham efeitos "equivalentes" às medidas convencionais, havendo entre elas complementariedade, dado que respondem por objetivos distintos. Às medidas macroprudenciais cabem manter a estabilidade do sistema financeiro, enquanto às medidas convencionais (e não convencionais) cabem manter o controle da inflação. 

Isso dito, explica-se a minha surpresa (e provavelmente do mercado) com o depoimento do diretor de assuntos internacionais do banco. Como eu prefiro acreditar na honestidade intelectual das pessoas, meu palpite é que o diretor não concordava com a posição de "equivalência" à época e agora está demonstrando essa divergência. O problema é explicar essa ambiguidade para o mercado. Entende-se, desse modo, o porquê do banco não conseguir balizar as expectativas dos agentes: ele não consegue se comunicar com clareza há um bom tempo.

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Como se comportou a Taxa de Participação no Brasil nos últimos anos? Uma Análise com a Linguagem R

O objetivo deste estudo é analisar a evolução da Taxa de Participação no Brasil, contrastando-a com a Taxa de Desocupação e decompondo suas variações para entender os vetores (populacionais e de força de trabalho) que influenciam o comportamento atual do mercado de trabalho. Para isso, utilizamos a linguagem R em todo o processo, desde a coleta e o tratamento das informações até a visualização dos resultados, empregando os principais pacotes disponíveis no ecossistema da linguagem.

Como se comportou a inflação de serviços no Brasil nos últimos anos?

Uma análise econométrica da inflação de serviços no Brasil comparando os cenários de 2014 e 2025. Utilizando uma Curva de Phillips própria e estimativas da NAIRU via filtro HP, investigamos se o atual desemprego nas mínimas históricas repete os riscos do passado. Entenda como as expectativas de inflação e o hiato do desemprego explicam o comportamento mais benigno dos preços atuais em relação à década anterior.

Como se comportou o endividamento e a inadimplência nos últimos anos? Uma análise utilizando a linguagem R

Neste exercício realizamos uma análise sobre a inadimplência dos brasileiros no período recente, utilizando a linguagem R para examinar dados públicos do Banco Central e do IBGE. Investigamos a evolução do endividamento, da inadimplência e das concessões de crédito, contextualizando-os com as dinâmicas da política monetária (Taxa Selic) e do mercado de trabalho (renda e desemprego).

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.