Baixo crescimento do PIB e aumento de juros: faz sentido?

Para um macroeconomista, essa quarta-feira, 29/05, guardava fortes emoções. Isto porque, a um só tempo seria decidida a taxa básica de juros, a Selic, que vigoraria pelos próximos 45 dias e seria divulgado o resultado do PIB do 1º trimestre. Para a primeira, muita incerteza, dado que não se sabia em qual magnitude o Banco Central  iria continuar o processo de aumento da Selic - ou mesmo, dado um PIB baixo, se não pararia o aumento. Para o segundo, a perspectiva era de um número baixo, próximo a 0,8%, se comparado ao trimestre anterior. No fim, as coisas convergiram para o bom senso.

O Comitê de Política Monetária decidiu pelo aumento de 50 pontos-base, levando a Selic para 8% ao ano. A ação corroborou a mudança de tom promovida pela diretoria do Banco Central, na direção de uma maior tempestividade no combate ao aumento generalizado de preços. Já o PIB veio abaixo até mesmo de previsões pessimistas: 0,6% contra o último trimestre de 2012. No lado da oferta, a Indústria continuou seu martírio, caindo -0,3%, enquanto que no lado da demanda o Consumo das Famílias estagnou em 0,1%, ambos na mesma base de comparação. Ainda que o ministro Mantega comemore o número de 4,6% de crescimento da Formação Bruta de Capital Fixo, é preciso relativizá-lo: como pode ser visto no gráfico abaixo, é mais uma compensação pela queda verificada no ano passado do que propriamente crescimento. Nunca é demais lembrar o termo "bruto" contido nessa métrica - não é mesmo, ministro?

fbcf

Deixada a implicância com o ministro de lado, o leitor atento pode notar que talvez isso seja inócuo: o PIB veio baixo e ainda assim o Copom tomou uma decisão de elevar a Selic? Pois é: e ele [o Copom] está certo em fazê-lo. O descolamento das expectativas em relação à meta, o crescimento dos salários acima da produtividade e, agora, o fato do câmbio ter voltado a desvalorizar, indicam que as pressões inflacionárias tenderiam a permanecer caso o Banco Central colocasse o pé no freio no aumento dos juros. Em outros termos, mesmo com baixo crescimento, há pressões inflacionárias persistentes na economia brasileira, que só cederão quando a taxa de desemprego começar a subir. E isso depende basicamente do Copom colocar a taxa real de juros acima daquela considerada neutra.

Nesse contexto, dada a demonstração de compromisso do Banco Central com a tempestividade para levar a inflação para patamares menores do que o atual, o orçamento revelado do aumento dos juros passa para 200 pontos-base. Nesse patamar, supondo a expectativa de inflação em 5,5%, a taxa real se situaria em 3,55%, o que é mais condizente com a estrutura da economia brasileira.

Em assim sendo, leitor, a decisão do Copom não só foi prudente como tardia: ela já deveria ter sido tomada muito antes, dadas as pressões inflacionárias remanescentes. A redução de 525 pontos-base realizada entre agosto de 2011 e outubro de 2012, não apenas não conseguiu reativar a economia, como gerou um oxímoro entre produto e mercado de trabalho. Esperamos, portanto, que a condução da política monetária deixe de ser errática e volte a se preocupar com uma única coisa: a estabilidade de preços. Feito isto, o crescimento brasileiro poderá depender de outras coisas que não estímulos pontuais - como reformas, não é mesmo, ministro?

 

Compartilhe esse artigo

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
Email
Print

Comente o que achou desse artigo

Outros artigos relacionados

Como usar IA + Python para o Mercado Financeiro?

Neste post, mostramos como a Inteligência Artificial, aliada à linguagem Python, está revolucionando o mercado financeiro. Exploramos as principais áreas onde essa tecnologia pode ser aplicada — como gestão de carteiras, análise de demonstrações contábeis, estratégias quantitativas, trading e análise macroeconômica — com foco em aplicações práticas e exemplos voltados para o contexto brasileiro.

Como otimizar um portfólio de investimentos no Python?

Este post apresenta, de forma prática e didática, como aplicar o modelo de otimização de carteiras de Markowitz utilizando Python. A partir de dados reais de ações brasileiras, mostramos como calcular retornos, medir riscos e encontrar a combinação ótima de ativos com base nas preferências de risco do investidor. Utilizamos a biblioteca Riskfolio-Lib para estruturar a análise e gerar gráficos como o conjunto de oportunidades e a fronteira eficiente.

O que são SLMs?

Assim como os LLMs, os Small Language Models (SLMs) são Modelos de Linguagem baseados em IA em versões mais compactas, projetados para funcionar com menos recursos computacionais, menor latência e maior privacidade. Neste exercício mostramos como usar estes modelos usando API's ou localmente através do Python.

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

Boletim AM

Receba diretamente em seu e-mail gratuitamente nossas promoções especiais e conteúdos exclusivos sobre Análise de Dados!

como podemos ajudar?

Preencha os seus dados abaixo e fale conosco no WhatsApp

Boletim AM

Preencha o formulário abaixo para receber nossos boletins semanais diretamente em seu e-mail.