Recebi com conforto, confesso logo de início, a tão comentada entrevista do professor Belluzzo ao jornal Estado de SP. Afinal, após os dissabores da campanha eleitoral ordinária - e por que não, mequetrefe - que tivemos no ano passado, é mesmo de acalmar a alma ver economistas como o professor e tantos outros, como o também professor João Sicsú, se sentindo indignados. O motivo, pode perguntar o leitor menos atento. Respondo, claro: Joaquim Levy. Sim, a representação atual de todos os medos e críticas da heterodoxia brasileira.
A entrevista do professor Belluzzo foi um primor. Exagero até que foi a expressão simbólica de todos os economistas que hoje se sentem traídos pela presidente. Afinal, após as inúmeras batalhas que esses economistas foram obrigados a ter com seus oponentes - o grupo de, surpresa, Joaquim Levy -, nada mais justo que esperassem ansiosos pelo louros da vitória nas urnas - ou, em miúdos, um ministério da fazenda para chamarem de seu. Com, claro, uma política econômica no segundo mandato que mantivesse os pilares da do primeiro. Arrisco: uma "nova matriz econômica 2.0"?
Pois é, não foi o caminho que a presidente escolheu seguir. Levy, afinal, é uma tentativa descarada - e sem vergonha? - de se manter no poder por tempo ilimitado. Manter o projeto de poder do PT, como disse outro dia o economista Eduardo Giannetti. Ou, como escreveu romanticamente o professor Sicsú, "o início do segundo governo Dilma indica que o pragmatismo de governabilidade venceu os sonhos e a história do PT". Para tanto, leitor amigo, "vale, vale tudo", como cantava magistralmente o gênio Tim Maia. Vale até trair os economistas-companheiros?
Ao que parece, sim. E contra isso, um monte de críticas, afinal, agora, os economistas-companheiros foram para a oposição. Um caso curioso, diga-se, em que os economistas que ajudaram a eleger o governo se opõem à política econômica que está sendo gestada. Coisas do Brasil...
Belluzzo, por exemplo, critica o ajuste fiscal. Diz, inclusive, que "a situação fiscal não é o desastre que apontam". Em miúdos, o déficit nominal próximo a 6% do PIB é coisa boba, leitor, diz o professor. Claro que não explica por que é necessário fazer o tal ajuste, em meio às desonerações e subsídios que foram dados nos últimos anos. Sempre sob influência sua e dos economistas ligados a sua linha de pensamento. Filho feio, leitor, é sempre um orfão...
A necessidade do ajuste existe e contra isso, Belluzzo e demais podem espernear, mas em algum momento haverão de concordar. O problema que se impõe ao governo é que o ajuste precisaria ser feito mais pelo lado do gasto - sim, com 39 ministérios, milhares de cargos comissionados e projetos que andam a passos de cágado, você não acha que se deve cortar? - e menos pelo lado da receita. Sabíamos todos que algum aumento de impostos era de se esperar, mas torcemos para que Levy consiga "cortar na carne". A tarefa é hérculea, claro, em um governo acostumado a distribuir benesses para alguns privilegiados...
Levy conseguirá? A parte "simples" ele fez: conseguiu estruturar pouco mais de R$ 40 bilhões no primeiro mês de gestão, com aumento de impostos e maior rigidez na concessão de benefícios sociais. A parte difícil do problema será convencer os outros 38 ministros a pisarem no freio - além, é claro, da própria presidente.
Enquanto esperamos pelos próximos passos de Levy, o melhor a fazer é assistir [com vista privilegiada, por que não?] ao ataque de nervos dos economistas-companheiros... 🙂