Sobre Porcos, Cordeiros e Notas de Repúdio

Na noite do dia 25 de dezembro, tomei conhecimento por meio do blog do Mansueto Almeida, que um grupo de economistas e não economistas havia redigido uma nota de repúdio ao texto "O Porco e o Cordeiro" de autoria de Alexandre Schwartsman. Reclama a nota, "Nós, abaixo assinados, vimos a público protestar veementemente contra a vileza de Alexandre Schwartsman ('O Porco e o Cordeiro', Folha de S. Paulo, 16/12/2015), que atinge de forma acintosa a professora Leda Paulani e o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, com quem o colunista mantém divergências públicas no campo das ideias, aludidos covarde e indiretamente como 'Leitoa' e 'Porco'".  Nesse pequeno post, crio também minha nota de repúdio. Aos pais (ocultos que estão) de mais um experimento heterodoxo implementado no país: a Nova Matriz Econômica.

Ao leitor, cabe informar o que foi a Nova Matriz. Os leitores particulares desse blog, claro, já sabem. Mas ao grupo mais geral, vai ai a definição do ex-ministro da fazenda, Guido Mantega:

"O governo Dilma Rousseff elegeu como um dos seus principais desafios dar um salto de competitividade na economia brasileira, sem abrir mão de se manter na rota da inclusão social e da redução da desigualdade trilhada nos anos precedentes. Nesse sentido, colocava-se como absolutamente estratégico remover, ou pelo menos minimizar, a distorção que havia nos dois principais preços do país: juros e câmbio". ('O primeiro ano da nova matriz econômica', 19/12/2012, jornal Valor Econômico).

Entre outras coisas, portanto, estava dado o recado: o governo Dilma Rousseff interveio (se ainda restava dúvidas naqueles idos de 2012) no Banco Central, forçando uma queda da taxa básica de juros, e no mercado de câmbio, tornando a taxa R$/US$ mais desvalorizada do que deveria ser. Tudo isso para quê, leitor? Juros mais baixos reduziriam o custo de capital para a indústria, bem como incentivaria o consumo das famílias, enquanto o câmbio mais desvalorizado tornaria os produtos brasileiros mais competitivos no exterior. Ok?

Juros altos e câmbio valorizado são os reclames de 9 em cada 10 economistas heterodoxos. Desde o início do plano Real, em julho de 1994. A crise de 2008 era, nesse contexto, a desculpa perfeita para interferir nesses dois preços da economia - não ficou só neles, como bem sabe o leitor, vide o ocaso da energia elétrica. E assim o fizeram: reduziram o juro real para menos de 2% a.a. em 2012 e interviram fortemente no mercado de câmbio, gerando uma taxa mais depreciada do que seria usual. Resultados?

Era preciso combinar com os russos, diria alguém. Ou, no caso específico, com a inflação. Juros mais baixos e câmbio mais desvalorizado não fizeram a economia crescer mais, pelo contrário o crescimento se reduz desde o final de 2010. E a inflação só fez aumentar desde então. Mas dados, afinal, não são mesmo o forte dessa turma, não é mesmo?

grafico
Fonte: elaboração própria com dados do Banco Central.

Paralelo à redução forçada dos dos juros e à desvalorização do câmbio, o governo usou de mecanismos não monetários para (tentar) controlar a inflação. Em outras palavras, congelou o preço da gasolinareduziu o preço da energia elétrica, além de interferir em outros preços administrados. O respaldo acadêmico disso está na tal teoria pós-keynesiana e no diagnóstico de que a inflação brasileira não seria de demanda, mas de custos, logo não se deve utilizar a política monetária para controlá-la.

Em outras palavras, leitor, o governo usou teorias heterodoxas, disponíveis por aí, para construir a Nova Matriz Econômica. Os novos-desenvolvimentistas, liderados pelo economista Bresser Pereira, estão roucos de supor que uma taxa de câmbio mais depreciada seria necessária para criar o desenvolvimento econômico. Os pós-keynesianos, como dito acima, cansam de repetir que não se deve usar a política monetária para controlar a inflação brasileira. E agora, que tudo deu errado (poderia dar certo?), onde estão os pais da Nova Matriz?

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(*) Marcos Lisboa e Carlos Eduardo Gonçalves publicaram artigo interessante sobre o assunto, titulado "A Crise e os Porcos" aqui.

(**) Minha experiência com a heterodoxia, aqui.

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