Nós, economistas, aprendemos lá no 1º período do curso [ao menos nos cursos sérios] que existe um trade-off [não estável] entre inflação e desemprego. Para os não economistas, significa dizer que se você tentar reduzir o desemprego abaixo do que se considera uma taxa natural de desemprego, a economia incorrerá em uma inflação em contínua ascenção. Isso, claro, apenas no curto prazo, devido a rigidez de preços e salários. No longo prazo, esse trade-off [essa dicotomia] entre inflação e desemprego desaparece, sendo o crescimento econômico [que reduz o desemprego] dado por outros fatores, tais como aumento do estoque de capital, produtividade, qualificação da mão de obra etc. A pergunta que fica, tendo esse conceito como base, é por que cargas d´água a economia brasileira vai crescer ao redor de 1% em 2012 e a inflação [IPCA] fechou em 5,84%, logo acima da meta do Conselho Monetário Nacional [CMN]?
Em termos não muito didáticos para os não economistas, digamos que nós podemos expressar esse trade-off entre inflação e crescimento econômico (ou de modo análogo, desemprego) pela fórmula abaixo:
Não se assuste! Significa dizer que a inflação no período t é dada, basicamente, por três coisas: inflação passada (t-1), o hiato do produto (a diferença entre o PIB efetivamente registrado e o PIB potencial, aquele que seria alcançado caso "toda" a mão de obra e "todo" o estoque de capital estivessem sendo utilizados) e uma coisa chamada de choques exógenos (ou de oferta) representada pelo último termo da equação acima.
A equação acima diz que a inflação do período t depende da inflação do período passado (muito verdade para o Brasil!!!!), depende da diferença entre o PIB efetivo e o PIB potencial e depende de choques exógenos que ocorrem na economia. OK? Certo, tudo muito bonito, tudo muito tranquilo. Mas você pode perguntar: a inflação está acima do centro da meta e o crescimento vai ser de 1% em 2012, logo o PIB efetivo está menor que o PIB potencial, assim o termo que mede essa diferença estaria contribuindo de forma negativa! Isto significa que toda essa inflação está no último termo [que em econometria a gente chama de resíduo]?
Sim, está! Nessa equação, ao menos, está. Se nós quisessemos modelar de outra forma, teríamos que complicar as coisas, mas não façamos isso, pelo bem do leitor não economista. No resíduo [último termo da equação acima] estão duas coisas que não foram consideradas: a) a taxa de desemprego não acompanhou o baixo crescimento, por basicamente dois motivos: as pessoas estão estudando mais e dados os custos de demissão, as empresas preferiram não demitir à espera de dias melhores. Isso, claro, pressiona a massa salarial, que pressiona o nível geral de preços; b) ocorreram problemas climáticos, que reduziram a oferta de produtos agrícolas [tanto in natura quanto commodities] e isso também pressiona a inflação.
Perceba, desse modo, que ainda que o hiato do produto [a diferença entre o PIB efetivo e o PIB potencial] não tenha pressionado a inflação, existem outros fatores que estão entrando naquela conta. Isto significa, com várias simplificações, que a teoria econômica [mesmo aquela rala que se aprende no primeiro período do curso] não deve ser abandonada. Existiram outras coisas [choques] que interferiram na dinâmica inflacionária. Essas coisas não informam, de maneira alguma, que nós devemos abandonar o trade-off não estável entre inflação e desemprego [no curto prazo]. O que elas dizem, apenas, é que a dinâmica da inflação depende de outros fatores que não apenas esse trade-off. Nós, economistas [sérios], chamamos essas coisas de choques de oferta.
Por fim, é claro que eu fiz várias simplificações ao expressar uma curva de phillips daquela maneira. Aos iniciados, por exemplo, eu deixei de lado as expectativas futuras de inflação, que eu [sim!] tenho grande apreço, eu deixei de lado o efeito dessa desvalorização cambial que o ministro da fazenda fez questão de fazer, eu deixei de lado a mudança de metodologia no IPCA... Mas, como o escopo era defender a manutenção do trade-off, acho que ficou de bom tamanho...