Volta e meia, vejo uma discussão para lá de desinteressante nas redes sociais sobre precarização do trabalho. Na maioria dessas discussões, Uber e outros aplicativos lançados há alguns anos são taxados como responsáveis por uma espécie de precarização nas relações de trabalho. Mas o que dizem os dados sobre isso?
Em primeiro lugar, é preciso dizer que sem o Uber e demais apps, pessoas em situação de desemprego teriam ainda mais dificuldade para gerar renda. De fato, como já publiquei nesse espaço, há não apenas uma correlação, mas uma causalidade entre desemprego e procura pela Uber. Em outras palavras, a existência desse e de outros aplicativos alivia a situação de desemprego porque permite às pessoas nessa situação uma geração de renda que não teriam na falta desses aplicativos.
Um outro ponto menos conhecido do grande público é que o emprego com carteira assinada nunca foi algo universal no mercado de trabalho. Em outras palavras, emprego com carteira assinada sempre foi um luxo, reservado a pessoas com maior qualificação. Para demonstrar esse ponto, basta que peguemos os dados da hoje extinta Pesquisa Mensal do Emprego. A seguir, carrego alguns pacotes e importo os dados que usarei nesse post.
library(magrittr) library(dplyr) library(readr) library(ggplot2) library(scales) library(forecast) ### Pacote Seasonal library(seasonal) Sys.setenv(X13_PATH = "C:/Séries Temporais/R/Pacotes/seas/x13ashtml") data = read_csv2('clt.csv', col_types = list(col_date(format='%d/%m/%Y'), col_double(), col_double(), col_double())) %>% mutate(razao = po_carteira/po*100) desemprego_sa = ts(data$desemprego, start=c(2002,03), freq=12) desemprego_sa = final(seas(desemprego_sa)) data = mutate(data, desemprego_sa=desemprego_sa)
Com as variáveis devidamente importadas e tratadas, posso construir um gráfico de correlação entre o desemprego dessazonalizado e a razão entre população ocupada com carteira e a população ocupada total.
Há uma correlação negativa forte entre desemprego e formalização no mercado de trabalho - e também uma relação de causalidade, do primeiro para o segundo, como mostro aqui. Isso dito, mesmo na mínima histórica da taxa de desemprego, o que vimos foi uma formalização um pouco superior à metade da população ocupada.
Nesse contexto, é incorreto dizer que esteja ocorrendo uma precarização do trabalho ao citar as ocupações nascidas a partir de aplicativos como o Uber. Primeiro, porque o emprego formal baseado na CLT nunca foi algo universal no Brasil, mesmo para níveis muito baixos de taxa de desemprego. Segundo, na ausência de aplicativos como o Uber, pessoas na situação de desemprego teriam ainda mais dificuldade de gerar renda. Isso dito, citar o Uber e outros aplicativos como sinônimos de precarização do trabalho é desconhecer os dados históricos do mercado de trabalho.
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(*) O exercício completo estará disponível no Clube do Código ao longo da semana.