COPOM surpreende o mercado

A redução de 50 pontos-base na taxa básica de juros [a SELIC] surpreendeu 9 em cada 10 economistas. Isto porque, com a inflação em 12 meses acima do limite superior da meta de inflação e uma pressão advinda do setor de serviços sem expectativa de arrefecimento, era [amplamente] esperada uma "parada técnica" por parte da autoridade monetária. Nunca antes, diga-se, o Cômite mudou de uma trajetória de aumento para redução sem antes passar por um período de estabilidade na taxa de juros. Não é por outro motivo que a grande maioria do mercado esperava por uma manutenção em 12,50% ontem.

Surgirão, já adianto, várias teorias de perda de autonomia da autoridade monetária nesse terceiro governo petista. Isto porque, como bem sabem os leitores, a independência técnica do BACEN é condição sine qua non para gerar credibilidade e com isso balizar as expectativas dos agentes em relação aos preços. A convergência para a meta de inflação só é possível quando os próprios agentes a tem como factível.

O que o COPOM mostrou ontem é que o seu compromisso é com o crescimento e não com a meta de inflação. A suposta alegação de que uma piora no cenário internacional fará com que o desaquecimento da economia doméstica seja maior e, por isso, a inflação convirja para o centro da meta no próximo ano não encontra respaldo nos condicionantes da inflação atual - quais sejam, serviços e alguns preços administrados.

A meu ver, a decisão foi uma tentativa de não cometer o mesmo erro de 2008, quando o BACEN "demorou demais", na visão de alguns analistas, para baixar a taxa básica. Eu discordo veementemente dessa hipótese, haja visto que naquela época o BACEN só pode fazer uma política monetária anticíclica porque os preços das commodities cederam o suficiente para compensar a desvalorização do câmbio sobre os preços domésticos. Sem isso, o Brasil teria de usar o mesmo remédio dos anos anteriores - aumentar juros para conter a fuga de capitais.

É claro que hoje a conjuntura é diferente. Não há no horizonte perspectiva de overshooting da taxa de câmbio [maxidesvalorização], dado que mesmo em um eventual aumento [ainda maior] de aversão a risco, o "voo para a qualidade" carece de pistas de pouso. O Brasil possui reservas e pode sim praticar política anticíclica, mas apenas se a situação externa piorar, algo que não está claro nesse momento. Já a inflação ainda não mostra claros sinais de arrefecimento.

Muito pelo contrário. Os sinais do mercado de trabalho são tempestivos quanto à contínua pressão sobre as atuais causas da inflação. Choques de oferta no segundo semestre não estão descartados. Menor pressão sobre o hiato do produto não significa necessariamente menor pressão inflacionária, dada a inércia inflacionária ainda persistente da economia brasileira.

O prometido "ajuste fiscal" é apenas uma promessa. Depende de negociações duras com o Congresso e com categorias importantes do funcionalismo público. Há uma rigidez não desprezível nos gastos correntes e reduzí-los exige maior eficiência do Estado. Seria o governo petista capaz de empreender tal eficiência?

O diagnóstico é que quem saiu perdendo ontem foi o arranjo macroeconômico brasileiro. Isto porque, como cabe à autoridade monetária balizar expectativas, é complicado surpreender agentes formadores de preços. E, agora, o que pensará o mercado sobre a condução da política monetária? O BACEN, a meu ver, perde um pedaço importante da credibilidade conquistada. E isso, não tenha dúvida leitor, será cobrado lá na frente com maiores custos para convergir a inflação para a meta.

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