O longo prazo brasileiro: a melhoria da produtividade do fator trabalho passa pela educação de nossos professores.

Uma das frases mais famosas - e medíocres - do economista John Maynard Keynes é a do no longo prazo estaremos todos mortos. Não digo medíocre para criticar o autor da frase, antes que me ponham na cruz. Não se trata disso. A mediocridade se trata da falta de filtro passa-baixa! Em outros termos: Keynes utilizou uma redução ao absurdo para alertar sobre os problemas que um choque - uma crise - pode causar ao mecanismo de preço - economia de mercado. Isto, entretanto, de forma alguma, significa que devamos esquecer do longo prazo. Neste post eu tento escrever o por quê.

Longo prazo, leitor, em economia, nada mais é do que uma sucessão de curtos prazos. Essa é a definição simples, sem paródias ou apelo ao tal fator fixo utilizado em modelos de crescimento. Desse modo, minha definição precisa aquilo que quero deixar bastante claro: se nada fizermos pelo longo prazo nos diferentes períodos de tempo da economia, nada acontecerá! Repito: um corpo em repouso permanecerá em repouso, caso nada lhe perturbe. E já aqui, portanto, esqueçamos o que Keynes disse, posto que aquilo, novamente, foi uma alegoria para andar de lado, dado que o mais importante era o tema presente da crise. A crise - inglesa ou norte-americana - era o inimigo público número um.

Para nós, tropicalistas, entretanto, a crise é apenas um choque, como foram tantos outros. Ele revela problemas importantes sobre o nosso processo produtivo ou em termos menos didáticos: ele revela o modo como nós delimitamos nossa função de produção. Não se  assuste, leitor: isso é algo simples de entender. A função de produção nada mais é do que uma relação que transforma insumos em produtos finais. Você entra com máquinas, equipamentos, tecnologia, mão de obra e transforma em televisores 3D, vídeo games, computadores etc. Tudo isso faz parte da função de produção agregada de cada país.

Você já percebe que os insumos utilizados fazem toda a diferença no momento de achar o f(x) dessa função, não é mesmo? Fato! A quantidade e qualidade de trabalho utilizados é um desses aspectos chaves para verificar se a nossa função de produção transformará insumos em bens e serviços em qualidade e quantidade satisfatórias.  O fator trabalho é, neste post, o item sobre o qual quero lhe chamar atenção quando estou escrevendo sobre longo prazo. Afinal, o nosso longo prazo, a nossa sucessão de períodos curtos, depende soberbamente do que faremos nessa seara chamada educação.

A capacidade de um país ofertar serviços em uma quantidade e qualidade razoáveis depende crucialmente do seu sistema educacional. Em nossa atual conjuntura, com a existência de um virtual pleno emprego, o tema da produtividade do fator trabalho passa a ser mais do que fundamental. Ela é a diferença entre crescimento sustentável ou algo do tipo stop and go, coisa que definitivamente poderíamos deixar no passado. Dito isto, como estamos quando o tema é educação? Melhoramos ou pioramos?

Deixando o pessimismo de lado, o fato é que hoje estamos um pouco melhor do que há duas décadas. Nós conseguimos colocar a maior parte das crianças na escola, reduzimos a taxa de analfabetismo entre crianças e jovens a níveis civilizados, construímos mecanismos de avaliação e financiamento da educação básica dentre outras pequenas conquistas. Isso, entretanto, não torna um sistema de educação básica competente na tarefa que lhe cabe: ensinar nossos alunos a serem independentes na tarefa de aprender.

Para que isso ocorra, é essencial reverter um aspecto crítico de nosso modelo educacional: a educação dos nossos professores. Em primeiro lugar, é preciso selecionar melhor os candidatos a professores. O Brasil é um dos poucos países - como em muitas outras coisas ruins - onde o professor não é selecionado no percentil mais alto dos exames de acesso ao ensino superior. Por aqui, os candidatos a licenciatura têm médias mais baixas nos vestibulares, o que implica na partida que algo está errado na formação de nossos futuros professores.

Reverter esse quadro requer uma pequena revolução do nosso modelo educacional. É preciso criar mecanismos de incentivo para que os melhores alunos do ensino médio se interessem pela licenciatura. Isso implica em criar projetos colaborativos, para gerar interesse na profissão de professor, como bolsas de iniciação a docência (monitorias) já no ensino médio. Além disso, é preciso realocar recursos, retirando dinheiro de cursos com alto retorno privado para os cursos com elevada externalidade, como as licenciaturas. Com esse dinheiro, é possível financiar nossos futuros professores desde o início da graduação, exigindo como contrapartida que não trabalhem e possam frequentar cursos integrais.

Nesse contexto, é preciso esvaziar a ideologia presente nas faculdades de educação. É necessário cortar as correntes históricas e construir currículos mais exigentes do ponto de vista teórico e didático. Um bom professor é umbilicamente um profissional bem formado e com treinamento delicado para o exercício diário do magistério. Isto porque, para ser professor, não basta ter conhecimento, é necessário saber passar esse conhecimento para seus alunos. Em assim sendo, bons cursos de licenciatura deveriam ser integrais, com no mínimo cinco ou seis anos de duração, incluindo ai dois anos de estágio obrigatório e supervisionado. Não se espera que alguém seja um professor sem ter pisado em uma sala de aula, antes de se formar - algo que, infelizmente, ainda acontece em nosso país.

Paralelo a tudo isso, deveríamos aumentar a remuneração dos professores que atuam na educação básica. Mas não antes disso. Proclama-se como panaceia que a valorização dos professores passa por aumentos horizontais de até 200% dos atuais soldos. Isso é de um reducionismo aberrante. Como se mais dinheiro nos levasse instantaneamente a um novo patamar de qualidade educacional. Caso implantássemos esse aumento linear - sem levar em conta as diferenças entre os atuais professores - a única coisa que teríamos seria: péssimos professores bem pagos. Será que queremos isso?

Não se estivermos pensando no longo prazo brasileiro. Se quisermos ter uma economia de alto crescimento será necessário termos bons professores bem pagos. E para que isso ocorra, será necessário atacarmos o problema desde a sua raiz, como apresentado anteriormente. Melhores professores serão forjados a partir dos melhores candidatos ao ensino superior. Jovens dotados de aptidão para poderem ser a um só tempo bons profissionais e com a didática afiada para serem bons professores. Sem isso, falar em melhoria na educação é apenas para inglês ver. Impacta pouco na produtividade da economia brasileira.

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