Desigualdade de oportunidades educacionais

Para terminar o domingo (de empate com o pessoal das laranjeiras) e começar a me preparar para essa dura semana que vem pela frente, nada melhor do que ler um paper sobre economia da educação. Nesse, em especial, trata de muitos pensamentos que já tive ao longo dessa vida e que chamei carinhosamente de Teoria do Estilingue (aquele mesmo que você brincava quando era criança). Então, a idéia é bem simples e bastante intuitiva: duas crianças já nascem com perspectivas de futuro completamente diferentes, dado o ambiente inicial em que viverão.

O paper não é sobre o Brasil. O seu título é "Equality of opportunity and redistribution in Europe". Mas tem vários insights e conceitos gerais que servem de referência para a tragédia educacional brasileira. A passagem do paper que eu gostaria de chamar atenção é a que segue abaixo:

"Relying on the rather philosophical work by Rawls (1971), Sen (1985), Dworkin (1981a, 1981b), Cohen (1989), and Arneson (1989), it is Roemer (1993, 1998) who introduces the concept of equal opportunities in the economics literature. Roemer (1998) separates the influences on the outcome an individual experiences into circumstances and effort. Circumstances are defined as including all factors outside individual
control. These can be, for instance, the individual’s social background, such as parental education, gender, age, place of birth or ethnic origin. Effort, on the other hand, comprises all actions and choices within individual responsibility, e.g. schooling choices and labor supply decisions or the degree to which one leads a healthy lifestyle (see Pistolesi (2009))".

Basicamente, Roemer - um dos percursores do conceito de igualdade de oportunidades e que não é um dos autores do paper - diz haver dois tipos de variáveis: as que você controla e as que você toma como dadas. Você não controla onde vai nascer, não tem influência sobre o grau de renda e escolaridade dos seus pais, não controla sua cor de pele etc. O que você controla é o seu grau de esforço em, por exemplo, buscar qualificação e em qual profissão tentará se especializar. Mas, veja, mesmo as decisões que dependem de seu próprio esforço encontram obstáculos (às vezes intrasponíveis) para serem efetivados.

Imagine, por exemplo, uma criança que nasce em uma favela carioca. A realidade social em que ela vive, a pressão para entrar muito cedo no mercado de trabalho, a distância da escola, o currículo defasado e por vezes tosco, professores mal remunerados e com pouca motivação para ensinar algo de maneira minimamente criativa etc. Ou seja, além de todas as dificuldades impostas pelas circunstâncias, mesmo que essa criança tenha uma maturidade ímpar e se esforçe para sair de sua condição atual, enfrentará ainda problemas estruturais graves no sistema educacional público.

A Teoria do Estilingue diz que na mesma coorte que começa o ensino fundamental, um percentual muito pequeno (ínfimo até) consegue entrar em uma universidade de ponta. E, diga-se, para piorar a Igualdade de Oportunidades Educacionais nesse país tupiniquim, as universidades de ponta são geralmente estatais e gratuitas. De novo, um percentual muito pequeno (22% dos ingressantes) entra nessas universidades gratuitas e são, geralmente, oriundas de onde, leitor amigo?

É claro que a estruturação de um sistema básico público de educação com qualidade reconhecida pelos exames internacionais tem um apelo econômico evidente. Ao aumentar e melhorar a escolaridade média da população, aumenta-se a produtividade do trabalhador e, claro, impacta em maior crescimento econômico. Mas não é apenas isso.  Dar condições iniciais mínimas reduz a grave assimetria de oportunidades educacionais existente no país.

A construção de um sistema público de educação com qualidade fará com que se extingue essas escolas privadas mequetrefes, que só sobrevivem porque a classe média brasileira prefere isso à matricular o filho em uma escola pública. Ou seja, aumentará a exigência qualitativa para a existência de escolas privadas. O sistema de educação básica, portanto, seja público ou privado, só tenderá a melhorar.

E, por último, aumentará o percentual de alunos de origem pobre que alcançará universidades de ponta Brasil a fora. Isso, eu sei, é algo que dificilmente verei, mas torço muito para que aconteça. Quando o esforço de um menino pobre for suficiente para que ele se forme Médico, Engenheiro, Economista, nosso país, enfim, estará pronto para ser desenvolvido.

Continuamos trabalhando, a propósito, para construir esse novo horizonte...

Para ler o paper (boa, garoto!) clique aqui.

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