Por que somos pobres?

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Em algum momento entre 2003 e 2006, muita gente acreditou que o Brasil, enfim, parecia trilhar o caminho da convergência. A transição do governo FHC para a administração petista manteve a macroeconomia intacta, bem como prometia trazer boas novas na microeconomia. Economistas liberais estavam postos na diretoria do Banco Central, no Ministério da Fazenda e na construção de uma política social mais focalizada - que daria origem, diga-se, ao Bolsa Família. Saía o discurso fácil do "Fora FMI" e entrava o pragmatismo da escassez. Eram, de fato, bons ventos.

Os problemas que ocorreram desde então parecem fartamente documentados em livros, artigos e textos de discussão. A saída de Palocci do governo petista, com a emergência da dupla Dilma-Guido no comando da economia, promoveu a ruptura nesse processo de convergência. A crise de 2008 jogou gasolina na ruptura, acelerando o abandono do tripé macroeconômico (superávits primários, câmbio flutuante e metas para inflação) e a desconstrução da microeconomia.

Muita tinta ainda será gasta para explicar os desmandos da Era Dilma que radicalizaram essa ruptura. Em certo sentido, saímos de um cenário com perspectiva de crescimento em torno de 5% e inflação mais próxima de 3% para o seu oposto. Acaso o processo de convergência tivesse sido aprofundado, as reformas microeconômicas que ficaram faltando na década de 90 teriam sido aprovadas, garantindo um melhor ambiente de negócios. Hoje, forçando o otimismo, cresceremos 2% ao ano, com inflação convergindo para a meta de 4,5% (uma inflação elevada para os padrões internacionais, diga-se).

Diante da ruptura, cabe a pergunta: onde erramos?

A resposta pode ser de uma simplicidade estonteante. Há ainda entre uma parcela considerável dos nossos economistas o desconhecimento do que, de fato, gera desenvolvimento econômico. Aquela convergência que muita gente achou que estava em curso não abrangia a maioria dos nossos economistas. Muito pelo contrário, era visceralmente atacada por eles.

O crescimento econômico se dá como um processo de aumento sistemático da produtividade, proporcionado, basicamente, por inovações tecnológicas e capital humano. Em outras palavras, o aumento da produtividade não é a causa do crescimento, é o próprio processo de crescimento em si. O que causa crescimento - aumento sistemático da produtividade - é a forma como os incentivos estão postos na sociedade.

Nossa pobreza se explica, nesse contexto, pela forma como os incentivos estão equivocados em nossa sociedade. Entre as 15 profissões mais bem pagas no país, 9 estão no setor público. Abrir um escritório em Brasília, construindo laços com o poder estatal, é algo mais incentivado no atual estado de coisas do que promover uma inovação.

O menino na casa dos 20 e poucos anos que faz engenharia nesse momento pode preferir fazer um concurso para o poder judiciário do que construir um aplicativo para Iphone. A burocracia para criar uma empresa ou o risco de desemprego em uma empresa privada competem com salários elevados e estabilidade no setor público.

O Estado brasileiro define nossa pobreza, ao colocar os incentivos no lugar errado. Ele mantém uma economia muito fechada, garantindo rendas de monopólio em diversos setores e baixa absorção de tecnologia da fronteira. Ele promove a desigualdade de renda, ao distorcer o mercado de trabalho e ao garantir educação superior subsidiada apenas para alguns e péssima educação básica pública para muitos. E, claro, torna o ambiente de negócios inóspito, com uma legislação ensandecida.

O Estado brasileiro ao invés de ser o árbitro nos diversos conflitos entre os agentes é ele próprio o maior causador de conflito, tendo sido capturado por alguns em claro detrimento do bem estar da sociedade.

Como mudar? É preciso convencer corações e mentes de que os incentivos precisam ser postos no lugar certo. Ao Estado caberia, basicamente: (i) operar uma política econômica intertemporalmente consistente; (ii) construir um ambiente de negócios propício ao investimento, à inovação e ao acúmulo de capital humano; (iii) arbitrar conflitos com celeridade; (iv) promover igualdade de oportunidades.

A crise econômica que vivemos tem raízes estruturais na medida em que sinaliza o abandono da agenda que levaria o Estado a cumprir esses quatro itens. A política fiscal foi dilacerada, enquanto a monetária descuidou do seu objetivo básico, a inflação. O ambiente de negócios sofreu forte intervenção, o que deixou tonto o mecanismo de preço. Os processos no judiciário continuam tendo um final distante. E o Estado continua promovendo desigualdade de oportunidades, notadamente na educação.

A saída da crise, nesse contexto, pode ser conjuntural, uma espécie de volta à posição de equilíbrio que vivíamos antes da Era Dilma ou pode ser estrutural. Para tal, devemos voltar à convergência rascunhada entre 2003 e 2006. Possível?

As vozes contrárias à convergência são muitas e bastante influentes. Entretanto, nos últimos dez anos um movimento liberal emergente tem se propagado pelo país. Parece uma resposta à ruptura. Temas como privatização, melhora do ambiente de negócios, transparência e controle dos gastos públicos, avaliação de políticas públicas, dentre tantos outros, já são tratados e discutidos por grupos cada vez maiores. Sem preconceitos.

Pode vir daí a volta à convergência? Será uma luta política, não tenha dúvidas. Afinal, a teoria econômica e a evidência empírica apenas indicam o caminho do desenvolvimento. Cabe à cada sociedade querer utilizá-las ou não...

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Vítor Wilher é Bacharel e Mestre em Economia, pela Universidade Federal Fluminense, tendo se especializado na construção de modelos macroeconométricos e análise da conjuntura macroeconômica doméstica e internacional. Sua dissertação de mestrado foi na área de política monetária, titulada "Clareza da Comunicação do Banco Central e Expectativas de Inflação: evidências para o Brasil", defendida perante banca composta pelos professores Gustavo H. B. Franco (PUC-RJ), Gabriel Montes Caldas (UFF), Carlos Enrique Guanziroli (UFF) e Luciano Vereda Oliveira (UFF). É o criador da Análise Macro, empresa especializada em treinamento e consultoria em linguagens de programação voltadas para data analysis, construção de cenários e previsões, fundador do hoje extinto Grupo de Estudos sobre Conjuntura Econômica (GECE-UFF), Visiting Professor da Universidade Veiga de Almeida, onde dá aulas nos cursos de MBA da instituição e membro do Comitê Gestor do Instituto Millenium. Leia os posts de Vítor Wilher aquiCaso queira, mande um e-mail para ele: vitorwilher@analisemacro.com.br

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