Juros, Dívidas e Crescimento: qual será a resposta da administração Dilma Rousseff?

A semana foi marcada pela redução da Selic - de 9% para 8,5% - e da divulgação do resultado do PIB do 1º Trimestre. Tanto um quanto o outro já esperados. Obedecendo às expectativas do mercado, o Copom resolveu seguir com o afrouxamento monetário em 50 pontos-base. A parada técnica - aquele período em que a autoridade monetária para de cortar os juros e verifica o passar das defasagens - agora é aguardada em 8%. A demora na reação da economia frente aos estímulos monetários e fiscais - demonstrada pelos 0,2% de crescimento na margem do PIB - parece evidenciar que a política econômica anticíclica terá mais trabalho dessa vez. A questão que se coloca é que i) a reação é aguardada para o segundo semestre; ii) não será uma reação suficiente para levar o PIB para além dos 3%. Diante disso, minha pergunta: como se comportará este governo?

Cada vez mais se mostra o óbvio na imprensa especializada: o endividamento das famílias. Se você, leitor, pegar os dados das Contas Nacionais, verá que o Consumo das Famílias vem crescendo em termos anualizados na casa dos 4,5% desde 2003. Você pode achar que isso se deu graças ao aumento da massa salarial, mas não pode esquecer do aumento do crédito. Crédito é um dos motores do ciclo de crescimento experimentado pelo Brasil nos últimos anos. E daí que, se você impulsionar a demanda, as expectativas dos empresários melhoram, os investimentos em aumento da capacidade se materializam, mais trabalhadores são contratados, o desemprego diminui, a massa salarial cresce e a economia entra em um ciclo virtuoso. Tudo isso, claro, abençoado por ampla liquidez internacional e pela elevação dos preços das commodities.

Problemas, leitor? Se você olhar os determinantes do crescimento brasileiro - crédito, liquidez e elevação de preços das commodities - verá que eles já não são os mesmos. O endividamento das famílias atinge nível perigoso, o que dificulta que o canal de crédito seja relevante para a retomada. Li, inclusive, alguns artigos e colunas comparando o nível de endividamento brasileiro com de outros países. Nessas análises, nosso nível de endividamento seria muito menor do que o de países selecionados, como EUA. Mas isso foi devidamente rejeitado por economistas sérios. Isto significa que tentar estimular os consumidores a fazer dívida - usar crédito - para comprar, principalmente, bens duráveis, dará menos certo dessa vez.

Agora o cenário externo. A liquidez internacional está abalada pelos problemas na Europa e pela lenta recuperação da economia norte-americana. A fuga para a qualidade parece ser a tônica daqui em diante. O fator China também deve ser considerado. Na margem, os preços das commodities despencam. Isso tem um impacto direto no balanço de pagamentos: menos fluxo de capital, mais dificuldade para financiar o déficit em conta-corrente, taxa de câmbio mais desvalorizada.

Resumindo, temos uma economia operando com taxa de desemprego na faixa de 6%, cenário externo difícil e transmissão de políticas anticíclicas dificultada. Isso  gera um equilíbrio ruim. Em outras palavras, gera um equilíbrio de baixo crescimento. Pergunto, novamente: como este governo reagirá? Como, infelizmente, não posso prever o futuro só me resta basear no passado e no presente para responder a essa pergunta. E com tal bengala só me resta concluir que este governo continuará tentando - a todo custo, ressalta-se - estimular o consumo. Lembrando que mais consumo, mais investimento, ciclo virtuoso...

E, em assim sendo, no que dará? Ninguém duvida de que seja correto utilizar instrumentos de política econômica em momentos anormais como o atual. O que vejo como problema é que tais expedientes não estão encontrando ressonância no organismo econômico, dada a deterioração das expectativas e o nível de endividamento das famílias. Daí que o governo poderá achar que já é hora de intervir de outras formas. Restringir importações, impor quarentena no mercado de câmbio, dificultar liberação nas alfândegas e, o mais grave, utilizar a política fiscal. Afinal, todo keynesiano que se prese gosta de incentivos na veia, quando o doente parece terminal. Daí para sugerir redução do superávit primário, aumentar as injeções do Tesouro ao BNDES, dentre outros expedientes com impacto na qualidade do endividamento público será um pulo. O Krugman pode achar que credibilidade da política econômica seja uma grande besteira, mas se ele fosse brasileiro, acho que pensaria mais de 2s a respeito.

O equilíbrio é ruim por dois motivos: o cenário externo é ruim e a economia já não reage tão bem aos estímulos anticíclicos. O Brasil não é uma ilha, que pode crescer às custas de seu "vasto" mercado interno. Muito pelo contrário: nós crescemos condicionados pelo setor externo. Foi possível em 2010, mas lembre-se: gerou inflação. Seria ideal se este governo resolvesse aproveitar o momento e gerar as tais reformas estruturais. Tudo bem, você vai falar que eu sou obsessivo: mas tentar pensar em estimular só a demanda é que me parece ser uma obsessão. E dessas que pode matar o doente, antes dele se recuperar...

 

Update: Acabei de ler uma bela análise do Celso Pastore aqui.

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