Choques adversos ou represamento de preços?

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Nelson Barbosa escreveu artigo na Folha semana passada chamando atenção para a administração de Ilan Goldfajn à frente do Banco Central. Para Barbosa, Ilan teria apenas colhido os frutos plantados por Alexandre Tombini, a quem coube a ingrata tarefa de elevar os juros para conter a inflação em aceleração. No decorrer do artigo, Barbosa classifica o aumento de preços de energia e a desvalorização cambial de "choques adversos" sobre a economia brasileira. Será mesmo?

Para examinar a questão, considere o seguinte modelo básico:

(1)   \begin{align*} y = b_0 + b_1 x + \varepsilon, \end{align*}

onde y é nossa variável de interesse, x é um vetor de variáveis explicativas e \varepsilon é um termo de erro que captura tudo o que não está sendo explicado pelo nosso modelo. Isto é, nele estaria o tal "choque" sobre a variável y.

Isso dito, o que chamamos de choque é algo não previsto, certo? O problema na definição de Barbosa sobre "choques adversos" que afetaram a economia brasileira no final de 2014 para o ano de 2015 é que tudo ali estava previsto. Para examinar a questão usando dados, vamos nos concentrar nos preços da energia elétrica residencial e na gasolina. Enquanto o preço da gasolina foi mantido represado durante boa parte do governo Dilma, o preço da energia elétrica residencial sofreu um duro ataque com a MP 579, que alteraria o marco regulatório do setor. Esses preços são considerados administrados, porque seus reajustes são feitos de acordo com algum contrato, sofrendo forte interferência do governo de plantão. O gráfico abaixo ilustra.

 


 

Observe que o preço do subitem energia elétrica residencial tem uma queda brusca no final de 2012, início de 2013, por conta da tal MP 579. Já o preço da gasolina mantém-se quase sempre em uma banda limite até o final de 2014. Ambos os preços sobem drasticamente após as eleições de 2014, refletindo o represamento feito durante o governo Dilma. O que há nesses dois casos, portanto, é apenas consequência do que foi feito anteriormente pelo governo Dilma. Fato, infelizmente, esquecido por Barbosa.

Para além disso, é importante notar que o represamento de preços administrados atendia a uma estratégia alternativa mais geral de controle da inflação, deixando os juros de fora do processo. Isto é, o governo Dilma tinha como objetivo controlar a inflação ao tentar controlar preços administrados, evitando assim usar os juros para tal tarefa. Isso inclusive está documentado na heterodoxia econômica que sustentou teoricamente aquele governo. Novamente, um fato esquecido por Barbosa.

Tudo isso dito, soa leve demais chamar de "choques adversos" o que na verdade foi uma correção dos erros de cometidos pelo governo na condução da política econômica, em particular da política monetária. Ocorre choque quando não é possível antecipá-lo, o que claramente aqui não era o caso.

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O código que gera o gráfico está disponível no repositório do Clube do Código.

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